Outro dia, um estaleiro famoso me pediu para interceder junto a um cliente deles sobre um problema que havia acontecido na pintura do casco de um barco vendido e entregue há 4 anos. O problema já havia escalado para um tribunal de defesa do consumidor. Os termos de garantia cobrem boa parte da estrutura do barco, mas talvez a baixa manutenção possa causar vários outros problemas. A disputa sobre quem tem razão é sempre dramática!
A crença geral é de que “o cliente sempre tem razão”, mas isso tem se provado errado. Alguns comerciantes acham que o cliente tem razão até R$500, por exemplo. Outros vão mais além e agem como se o cliente nunca tivesse razão.
O conceito tradicional de que qualquer cliente é um bem difícil de conseguir e muito fácil de perder provavelmente veio de um caso que eu estudei na Universidade. A história era de um sujeito que tinha o costume familiar de tomar sorvete depois do jantar. Ele repetia este hábito todas as noites, variando apenas o tipo de sorvete. Entretanto, após trocar o seu carro antigo por um modelo novo, suas idas à sorveteria se tornaram um pesadelo. Sempre que ele comprava sorvete de baunilha, ao voltar para casa, o carro não funcionava. Se comprasse qualquer outro tipo de sorvete, o carro funcionava normalmente.
Muito chateado, ele então enviou uma carta ao fabricante do carro, que passou de mão em mão até chegar ao presidente da fábrica, que resolveu levar o negócio a sério e mandou um engenheiro conversar com o cliente, autor da carta. O engenheiro e o reclamante foram então juntos à sorveteria com o carro novo.
O engenheiro sugeriu o sabor de baunilha para testar a reclamação, e o carro realmente não funcionou. Nos dias seguintes, o engenheiro da fábrica, na mesma hora de sempre, fez o mesmo trajeto, no mesmo carro, e somente variou o sabor do sorvete. Mais uma vez, o carro só não pegava quando o sabor escolhido era o de baunilha.
O problema acabou virando uma obsessão para o engenheiro, que passou a fazer experiências diárias, anotando todos os detalhes possíveis, e depois de duas semanas chegou à primeira grande descoberta. Quando escolhia baunilha, o comprador gastava menos tempo para ser atendido. Examinando o carro, o engenheiro fez uma nova descoberta: como o tempo de compra do sorvete de baunilha era menor em comparação com os outros sabores, o motor não chegava a esfriar. Com isso, os vapores de combustível não se dissipavam, impedindo que a nova partida fosse instantânea. A partir desse episódio, o fabricante desenvolveu um novo sistema de alimentação de combustível, que passou a integrar todos os modelos a partir de 1959.
Bom, todo mundo sabe que tem cliente que é chato, mas não se pode generalizar. Também existe o comerciante que não gosta do cliente, mas não se deve deixar que a falta de profissionalismo faça com que ele entregue um barco inacabado e sem condições de navegar. Isso é um mau exemplo para todo mundo: para o construtor, para os consumidores e para a indústria. Afinal, até o fechamento deste texto, o cliente ainda tem sempre razão.