Layout do Estaleiro


Nenhum barco deve ser construído ao ar livre. Os materiais sofrem por ficarem expostos durante a construção e o resultado é um produto de qualidade inferior.  As ferramentas também sofrerão se deixadas ao ar livre e guardá-las diariamente resultará em gasto de tempo.  Além disso, haverá dias de chuva. Por essas razões, é essencial uma cobertura para a fabricação do barco.

A primeira coisa a ser determinada é a área necessária para a construção.  Como regra geral, o tamanho mínimo é de duas vezes o tamanho do barco.  Isto proporciona espaço suficiente para uma bancada, para a maioria das ferramentas e estoque de materiais, e para que se possa andar e trabalhar ao redor do barco.  Note que, se está se pensando em desenvolver um modelo e fôrmas, a necessidade de espaço poderá ser maior.

Caso você utilize ferramentas estacionárias, será necessário um espaço maior.  Lembre-se de deixar espaço suficiente ao redor das ferramentas de forma a poder trabalhar com grandes peças de madeira ou mesmo metal.

Em alguns casos de construção de catamarans, a necessidade de espaço pode ser contornada.  É possível fabricar os cascos separadamente e armazená-los fora do galpão, aguardando a montagem final, que pode ser feita do lado de fora.  Tenha sempre em mente, durante a montagem de um galpão, a possibilidade de expansão, pois durante esta ou a próxima obra poderá ser necessário mais espaço.

Você já sabe onde construir seu barco?

Construindo com Fibras de Vidro

A fibra de vidro que normalmente se utiliza na fabricação de barcos é conhecida por uma gama de nomes diferentes mas que, na verdade, significam a mesma coisa.  Dependendo do lugar ou de quem está falando, você poderá escutar termos como fibra de vidro, fiberglass, plástico reforçado com fibra de vidro ou suas abreviaturas FRP, GRP ou PRFV.  Em todos os casos, esses termos e abreviaturas significam a utilização de fibras de vidro em conjunto com uma resina. 

A história das fibras de vidro começou em 1836, quando foi patenteado na Europa um método de tecer vidro maleável. Em 1839, tecidos de fibra de vidro foram então colocados pela primeira vez em uma exposição industrial e, por volta de 1840, essa mesma fábrica começou a receber seus primeiros pedidos. É lógico que o material não resistiu à competitividade de outros produtos industrializados de sua época e logo desapareceu. Eu diria que o motivo foi o preço muito alto. Levou praticamente um século até que esse material ressurgisse no mercado mundial para utilização em isolamento de cabos e condutores elétricos. A partir de 1940, o desenvolvimento das resinas sintéticas promoveu uma ampla utilização para esse tipo de fibra e suas aplicações abriram uma grande variedade de mercados.

As fibras de vidro são produzidas a partir do vidro em forma líquida, que é resfriado a alta velocidade. Através do controle de temperatura e velocidade de escoamento do vidro são produzidos vários tipos de filamentos com diâmetros variados. Os filamentos de diâmetro contínuo são tratados para melhorar a sua adesão e resistência à abrasão e umidade. O tipo de tratamento dos fios é determinado, em uma fase seguinte, de acordo com sua aplicação.

Construindo com Espumas de PVC

Atualmente as espumas de PVC são um dos tipos de núcleo mais utilizado na construção de peças estruturais de materiais compostos. As últimas formulações disponíveis têm oferecido enormes vantagens para a construção de laminados de alto desempenho. Algumas espumas de PVC oferecem quase o mesmo desempenho estrutural e o baixo peso que os honeycombs, com a facilidade de ser uma estrutura macroscopicamente sólida o que permite a laminação direta sobre sua superfície, e o mais importante, com um custo menor.

As espumas de PVC podem permitir uma deformação por cisalhamento em até 50%, conhecidas como Divinycell® e Maricell®, possuem elevada resistência à compressão e ao cisalhamento, além de possuírem excelente resistência química e tem uma temperatura de operação que varia entre –40°C e 120°C. Além disso, sua formulação e produção fazem com que tenham 100% de células fechadas, o que impede a absorção de água.

Esse material é produzido a partir de uma mistura de polímeros e resinas à base de PVC em um processo computadorizado que garante a precisão na formulação dos componentes químicos. A partir deste ponto, a mistura é colocada em pequenas formas metálicas, onde passa por um processo de aumento de temperatura e pressão. Logo após, é expandida com vapor d’água, curada em ambientes climatizados e estabilizados termicamente, antes de ser levada para processamento e corte. O processo de fabricação de uma espuma deste tipo consome de três a quatro semanas até os blocos estarem prontos para serem trabalhados. Dependendo da densidade, o tempo pode chegar a oito semanas.

Essas espumas de PVC são fabricadas em diversas densidades, as mais comuns são 40, 45, 60, 80, 100, 130, 160, 200 a 250 kg/m³. Cada densidade é codificada por uma cor diferente. Assim, as espumas de 45 kg/m³ têm cor azul, as de 60 kg/m³ cor amarela e as de 80 kg/m³ cor verde. Suas espessuras variam de 3 até 75mm e podem ser adquiridas em chapas planas ou cortadas em blocos de 40 x 40mm, coladas em uma tela de fios de vidro (GS – Glass Scrim).

É lógico que existe uma variedade imensa de outros produtos feitos a partir deste material e eles podem ser solicitados de acordo com sua aplicação específica. Existem vários tipos de corte disponíveis no mercado como DC, GSN, GSNS ou GSH. As espumas com cortes para infusão são projetadas para atender a permeabilidade da resina dentro do laminado. A configuração do corte longitudinal e transversal também possibilita que o projetista possa direcionar a frente de resina para onde ele achar mais interessante ou onde houver uma maior concentração de fibras com baixa permeabilidade.

Aplicando Gelcoat

Poucas pessoas podem imaginar que por trás do brilho do acabamento no gelcoat dos barcos, uma infinidade de variáveis esconde um processo cheio de truques e armadilhas que só alguns construtores conhecem.  O gelcoat é a camada mais externa do casco de um barco, geralmente branca, mas esta pode ser de qualquer cor. Aplicada em primeiro lugar dentro do molde, antes das laminações das camadas de fibra, a espessura média dessa camada é de, aproximadamente, 0,6 milímetros. Sendo tão fina, não dá margem para erros na sua formulação ou aplicação.

Construtores experientes, que geralmente produzem laminados de fibra de vidro de boa qualidade, podem listar uma série de problemas com gelcoat e com boas razões. Na maioria das vezes, laminados de fibra de vidro e resinas poliéster podem curar com catalisador MEKP nas mais diversas proporções e em quase todas as condições de temperatura e umidade, embora produzam laminados de qualidade suspeita. Gelcoats são, na verdade, uma mistura de resina poliéster e uma série de cargas minerais. Em sua utilização, são muito sensíveis a qualquer tipo de variação, podendo produzir incríveis surpresas após a desmoldagem das peças.

Além da proporção de catalisador, outra variável também difícil de se controlar é a espessura do filme de gelcoat. Se aplicado muito grosso, várias rachaduras poderão aparecer em muito pouco tempo. Se aplicado muito fino, provavelmente haverá uma série de defeitos de enrugamento a serem corrigidos após a desmoldagem do casco e o construtor irá gastar horas e mais horas reparando, repintando e polindo a peça.       

Essa variação crítica de espessura é algo em torno de mais ou menos dois décimos de milímetro. Geralmente, os construtores consideram a aplicação de gelcoat muito mais delicada que a laminação, porque a maior parte dos fabricantes desse tipo de material não sabe exatamente o que mistura, a maior parte dos vendedores não sabe o que diz e a maior parte dos gelcoteadores não sabe o que faz. Pode parecer engraçado, mas experimente passar duas horas ao lado do gelcoteador de uma fábrica que produza barcos, ou mesmo qualquer outra peça de fibra de vidro.

Quando Fabricar um Molde

Na maior parte das vezes, desenvolver um conjunto de moldes para a produção de um determinado modelo não é algo simples, muito menos rápido. A maioria dos grandes estaleiros tem sua própria divisão de fabricação de moldes, onde também são editados os manuais de construção, especificando como cada modelo deve ser contruído.  No caso de pequenas fábricas, o negócio fica mesmo por conta de uma equipe de técnicos qualificados, encarregados das seções de modelagem. Subcontratar outra empresa para desenvolver moldes e protótipos ainda não é uma idéia que faça sucesso, mas existe hoje um pequeno número de empresas que já prestam esse tipo de serviço.

Antes de mais nada, o aspecto econômico da fabricação dos moldes é fundamental. Eles são geralmente construídos quando se pretende fazer uma série de peças. No caso de barcos, mais do que quatro ou cinco unidades já são suficientes para que a maioria dos construtores opte pela fabricação de um barco através de moldes.  Esse também pode ser o caso de um grupo de pessoas juntando-se para a construção amadora de um mesmo projeto. No caso dos one-off ou protótipos, gastar tempo e dinheiro com modelos não é inteligente porque a qualidade de um barco construído nesse sistema  pode ser tão boa ou mesmo muitas vezes superior aos fabricados em série.

Normalmente, as pessoas vêem os desenhos dos antiderrapantes e outros detalhes de produção seriada e acreditam que isto representa um bom acabamento. Na verdade, estes detalhes apenas tentam melhorar a velocidade de construção de um barco produzido em série. Alguns desses modelos têm de ser produzidos em escalas de 20 a 30 por semana com um conjunto de vários moldes. Neste ponto, pode-se imaginar que não se tem tempo mesmo de pensar em modificar qualquer pequeno detalhe de construção ou acabamento sem prejuízo da produtividade.

Decidindo-se finalmente pela fabricação de um conjunto de moldes, o construtor deve escolher que tipo de construção, materiais e sistemas de moldagem que melhor se adaptam à construção desse novo modelo. Outro fator importante é descobrir qual é a experiência anterior do construtor e o que ele espera do produto final que os moldes produzirão.  Não adianta desenvolver um conjunto top quality de moldes se o construtor está disposto a construir um barco utilizando materiais de baixa qualidade.

Geralmente, um conjunto de moldes não se resume apenas a casco e convés, mas também devem estar incluídos contamoldes do interior, banheiros, peças do comando, fly bridge, targa, liners dos tetos, da cozinha, os sistemas de longarinas e das bases dos motores. O custo aproximado para desenvolver um conjunto completo, com quase vinte moldes de uma lancha de 34 pés pode chegar a mais de 150 mil dólares, isso sem levar em conta alterações de projeto que são comuns e podem fazer com que os preços subam considerávelmente. Outro detalhe é que o custo total não varia linearmente com o tamanho do barco. Se você pretende saber, por alto, quanto custará um molde, a conta mais rápida e também aproximada é calcular o valor do molde sendo de seis a oito vezes o valor final da peça acabada. Note que isto é apenas uma aproximação, já que o custo de um molde inclui também projeto, engenharia, detalhamento, design, modelagem, plug e, finalmente, o molde. Há um longo caminhao a ser percorrido. Se custo indiretos forem incluídos nesta conta, o valor dos moldes pode chegar facilmente a dez vezes do valor da peça. Somente uma boa planilha de custos, que inclua todo o processo produtivo dos moldes pode determinar o preço e o tempo gasto para se chegar ao produto final.

Quando usar Fibras de Carbono

A fibra de carbono representa uma evolução para a construção de material compostos assim como o desenvolvimento da fibra de vidro pela Owens Corning representou uma revolução para o início da fabricação das primeiras fibras de vidro. Isso porque ele é mais leve, mais forte e mais durável que qualquer outro material disponível no mercado atualmente.

A fibra de carbono foi desenvolvida no início da década de 60 por um consórcio de cientistas americanos, ingleses e japoneses. No entanto, foi patenteada no formato atual somente por volta de 1970, quando foi utilizada para fabricação de foguetes na indústria aeroespacial pela sua grande resistência e por suportar as altas temperaturas de reentrada na atmosfera terrestre. Sua primeira aparição na indústria náutica foi em 1979, para a fabricação de barcos a vela de regata e seu preço era superior a 200 dólares o quilo na época. Nas décadas seguintes começou a ser utilizada na fabricação de aviões comerciais como o Boeing 757, 767 e o Boeing 777, década de 90. Hoje, o Boeing 787 e os Airbus 350 e 380 são fabricados utilizando toneladas de fibras de carbono e seu preço está na faixa de 20 dólares por quilo.

As fibras de carbono são produzidas e comercializadas com diversos tipos de resistência, com espessura 10 vezes mais fina que um fio de cabelo e agrupadas em conjuntos de 3 mil a 50 mil filamentos. O preço de cada configuração, é claro, difere bastante das formas mais acessíveis encontradas na internet.

Em uma visão simplificada, as fibras de carbono são produzidas a partir de uma série de cristais alinhados e utilizada na fabricação de tecidos para a construção de carros elétricos, geradores eólicos, aeronaves, barcos e bens de consumo em geral. Estas características permitem que se fabrique um laminado com a metade do peso e cinco vezes mais resistente que um outro construído em alumínio ou fibra de vidro.

Devido a própria evolução dos materiais e métodos de construção, as fibras de carbono são a evolução natural para a substituição das fibras de vidro nas próximas décadas. Hoje muitos equipamentos são produzidos a partir deste produto, que cada vez ganha mais adeptos. Mesmo com um custo inicial maior, as características das fibras de carbono têm cada vez mais espaço em produtos presentes no cotidiano.

Apesar de muita gente já ter visto e escutado sobre fibras de carbono, poucos sabem como elas são fabricadas. Embora as fibras de carbono tenham a cor preta, existem vários tipos similares, mas não idênticos. A qualidade das fibras de carbono depende da quantidade e alinhamento dos cristais de carbono, podendo ser incrivelmente mais forte que o aço com apenas uma pequena fração do peso e apresentar preços que diferem em até 500%.

A fibra de carbono para aplicação em materiais compostos de alta performance é produzida a partir da transformação de uma molécula de acrílico, pela ação de calor em uma atmosfera sem oxigênio, em um composto de cristais de carbono. O processo começa combinando um monômero de acrilonitrila (PAN) com alguns ácidos para criar um sub polímero da família das fibras de Rayon. Esta mistura inicialmente em forma sólida é dissolvida em agentes orgânicos para formar uma pasta viscosa da cor branca (ao contrário da cor final preta das fibras). Esta gelatina então é então imersa em um liquido coagulante e centrifugada para promover a secagem e o estiramento das fibras e em seguida enroladas em bobinas.

Em seguida, estas fibras esbranquiçadas passam por vários fornos com temperatura acima de 300°C, para serem oxidadas, e depois novamente por outros fornos para serem carbonizadas a uma temperatura superior a 900°C.  Neste estágio as fibras já possuem mais de 90% de cristais de carbono e dependendo do tipo de cozimento elas podem chegar a ter 99% de carbono em sua molécula. As fibras então sofrem um banho para remover a contaminação da carbonização e são tratadas com uma cobertura superficial para que elas possam aderir na matriz de resina durante o processo de laminação.

O Uso de Honeycombs

As colmeias, conhecidas como honeycombs, foram desenvolvidas principalmente para o uso na indústria aeronáutica e aeroespacial, embora exista hoje uma linha desses produtos destinados à construção de barcos. Os honeycombs podem ser construídos de papel impregnados com resina, fibra de vidro, carbono, fibras aramidas, polietileno e alumínio.

Embora o conceito do uso de uma estrutura em forma de colmeia como material sandwich este tipo de material não se presta ao uso no processo de infusão pois todo o interior da célula seria impregnado ou preenchido com resina o que elevaria imensamente o peso da estrutura final.

Materiais de núcleos tipo colmeia possuem uma maior capacidade de compressão e cisalhamento do que qualquer outro com densidade equivalente. Esta é a razão de seu uso em aplicações onde baixo peso e rigidez são importantes.

As células dos honeycombs podem ter vários tipos de configuração, mas as mais usuais são as células hexagonais, triangulares e quadradas. Todas elas possuem boas propriedades mecânicas com baixas densidades, resistência ao impacto e à fadiga. Além disso, as de alumínio e fibras aramidas do tipo Nomex são resistentes ao fogo e possuem temperatura máxima de operação perto de 150°C. As densidades mais usuais das colméias do tipo Nomex são 32, 48, 64 e 96 kg/m3 com células hexagonais que podem ter as seguintes dimensões: 1/8, 1/16 e ¼ de polegadas. 

A matéria-prima básica de colmeis do tipo Nomex é um papel produzido a partir de fibras aramidas e recoberto com uma resina fenólica de alta resistência à temperatura. Há vários materiais que compartilham propriedades estruturais desse tipo, mas as de fibra aramida do tipo Nomex são as que possuem o melhor desempenho.

Uma das variações deste material, que tem tido uma boa aceitação em estruturas de alta performance, são as colméias fabricadas a partir de uma fibra para-aramida ou equivalente, impregnadas com resina fenólica. Este tipo de honeycomb é superior à do tipo Nomex e pode ser encontrado nas densidades 32, 40,48, 72 e 96 kg/m3, e suas propriedades mecânicas são aproximadamente 25% maiores que as do Nomex.

As propriedades mecânicas de todos os materiais do tipo honeycomb são listadas nas direções “L” (longitudinal) e “W” (transversal) e dependendo do tipo de construção e formato de célula, elas podem variar em até 100%. Durante a construção deve ser observada a colocação correta da direção da placa de honeycomb de modo que os requisitos de resistência em ambas as direções sejam atendidos.

Desenhando as Linhas do Casco

Embora alguns construtores iniciantes possam pensar que é possível construir um bom barco com apenas alguns rascunhos ou esboços, deve-se ressaltar que a representação correta e mais indicada  das linhas de um barco é feita a partir de planos. É necessário que as linhas e parte do plano de construção sejam desenhados sempre em escala e plotados de forma que o construtor possa obter, nestes desenhos, todas as informações necessárias à construção do casco. Alguns projetos são ainda oferecidos em escala natural, o que, sem dúvida, facilita a construção, com seus desenhos prontos para serem passados como gabarito para o material das cavernas a ser recortado.

Desenhos em escala natural, geralmente plotados em filmes de mylar, são necessários para aquisição de gabaritos quando um ou mais barcos são feitos utilizando o mesmo plano de construção, ou então na construção de cascos de veleiros de regata, em que o desenvolvimento das linhas deve estar em conformidade com as tolerâncias  das dimensões de alguma regra de performance.

Já se foi o tempo que era necessário ter uma sala de risco dentro do estaleiro, onde certamente o mais qualificado carpinteiro era responsável por desenhar e suavizar as linhas longitudinais do casco. Com a introdução do computador, existem alguns casos em que não há necessidade da representação em escala natural das linhas do casco, uma vez que softwares sofisticados podem fazer o carenamento de toda a superfície em poucos segundos.