Detalhes Estruturais – Fundo e Costado

Independente do regime de navegação da embarcação, seja planeio ou deslocamento, a interseção entre os painéis do fundo e do costado é um ponto crítico da estrutura. É ali que ocorre a transferência de tensões entre o fundo e o costado que podem variar em até 500% em embarcações de planeio. Por esta razão, o construtor deve buscar o arranjo mais rígido possível para proporcionar uma transição contínua das tensões geradas pelas cargas de impacto do fundo.

A primeira opção é apresentada na Figura 1, onde ambos os painéis, do fundo e costado terminam com a espuma em chanfro de 30° e deixa o plano do chine sólido com uma espessura adicional provida pelo overlap entre os tecidos do fundo e do costado. Nesta configuração, deve ser acrescentados tapes de 45° com overlap progressivo no fundo e costado para aumentar o momento de inércia da área sólida.

Figura 1

A Figura 2 apresenta uma variação, utilizando a espuma do costado montada diretamente sobre o plano do chine e o fundo é terminado com a espuma em chanfro. Nesta configuração também é necessário a adição de camadas de superposição no chine de modo a aumentar o momento de inércia da área sólida.

Figura 2

Por fim, o próximo detalhe é o que promove maior rigidez à junção entre os laminados do fundo e do costado, pois mantém o momento de inércia constante ao longo da passagem das tensões entre os dois planos. Neste detalhe ainda é adicionado um filete de espuma de PVC com um laminado na trama de 45° para criar uma transição perfeita do fluxo de tensões.

Figura 3

Esses são os parâmetros que o construtor deve ter em mente ao planejar a fabricação de um casco e algumas opções de configuração. É essencial ter ciência dessas variáveis e conhecerem a melhor maneira de construir esses detalhes para garantir a segurança e eficiência da embarcação.

Colagem Manual de Núcleos Sandwich

Os benefícios da construção sandwich na eficiência estrutural de embarcações depende não só da integridade do material de núcleo e dos materiais que compõe as faces, mas também da interface de colagem entre esses elementos que garante a transferência de esforços.

Quando se utiliza o processo de infusão a vácuo para fabricação de grandes estruturas, a resina absorvida pelo núcleo faz esse papel de criar uma ancoragem entre a espuma e suas faces. Quando se utiliza o processo de laminação manual, no entanto, o construtor pode recorrer à utilização de um adesivo de colagem e um compactador pneumático.

Além desses produtos, esse procedimento precisa de uma balança digital, um dosador de catalisador, um misturador e uma espátula dentada. A massa de colagem pode ser formulada a partir de resinas poliéster combinadas com cargas minerais e, por conta da periculosidade dos produtos, o laminador deve estar devidamente protegido.

Após pesar a massa, deve-se utilizar o dosador catalisador para coletar a quantidade adequada de catalisador, que varia entre 1,00% e 2,00% no caso de massas a base de resina poliéster.

Após adicionar o catalisador na massa, é necessário misturar a substâncias com uma batedeira de baixa velocidade e/ou misturadores manuais. É essencial garantir que a mistura fique homogênea e que o catalisador esteja misturado por todo o volume de massa adesiva.

A massa adesiva deve ser depositada por toda a superfície de colagem. Com uma espátula dentada, o aplicador deve formar um filme uniforme de adesivo por toda a área de colagem, com espessura que varia com o tipo de corte e espessura das placas.  

O núcleo de espuma PVC deve ser posicionado e aplicador dele acomodá-lo e ajustá-lo sobre a área cuidadosamente de forma manual.

O compactador pneumático deve ser ligado em uma linha de ar comprimido e o laminador deve utilizá-lo para pressionar o núcleo longitudinalmente em apenas uma direção, buscando garantir a entrada de adesivo nas ranhuras (groovings) das placas e retirar todo o ar aprisionado entre a massa de colagem e a espuma.

Após percorrer toda a área em baixa velocidade e garantir que a massa de colagem penetre todos os groovings, o laminador pode utilizar uma espátula para retirar o excesso de adesivo e observar se todos os espaços estão completamente preenchidos.

Se todo o procedimento for executado corretamente, a interface entre o laminado e o núcleo de espuma não terá nenhum defeito ou espaço vazio causado por aprisionamento de ar.

A execução correta desse processo vai garantir a integridade da estrutura e um fluxo eficiente dos esforços entre os elementos dos painéis sandwich, aumentando a segurança da navegação e diminuindo eventuais problemas, como delaminação.

Colagem Manual de Núcleo Sandwich

Detalhes Estruturais – Reforços L e T

A estrutura de uma embarcação de materiais compostos, independente de navegar em regime de deslocamento ou planeio, é formada por um conjunto de painéis delimitados por reforços transversais e longitudinais.

Esses reforços são um conjunto de anteparas,  longarinas e cavernas. Em outro post sobre os detalhes estruturais da construção de embarcações em material composto foi apresentado uma longarina com perfil “hat section”, como mostra a figura abaixo.

Entretanto esse tipo de perfil pode ser substituído por outros modelos de reforçadores mais eficientes, produzidos com uma configuração específica de lay-up pelo processo de infusão a vácuo. A primeira opção para essa substituição é o perfil e L, presente na figura abaixo.

O reforçador em L é uma tendência na aeronáutica que fabrica esses perfis otimizados com almas com núcleo de espumas PVC e faces laminadas com tecidos triaxais de orientação [0/±45]. Já os flanges são construídos de laminados com várias camadas de tecidos unidirecionais. Esses perfis devem ser fabricados por meio de infusão a vácuo para que seja possível alcançar um teor de fibras de 70% em peso. A colagem do perfil na estrutura deve ser feita com filete de massa de microsfera e laminação secundária utilizado tecidos biaxiais a +45/-45 graus.

A largura da alma e do flange, assim como a altura do perfil, devem ser determinadas na fase do projeto estrutural da embarcação, que deve definir qual o módulo da seção requerido para cada um dos perfis. As normas de sociedades classificadoras auxiliam o projetista a ter um norte para iniciar essa tarefa. Esse tipo de configuração fornece uma grande resistência á flexão dos perfis, além de prevenir a flambagem que é muito comum em perfis “hat section”.

Outra opção é o perfil T apresentado na figura abaixo, que deve ser apoiado em dois filetes de espuma PVC. Ele pode ser construído a partir da montagem de dois perfis em L com a laminação contínua dos flanges ou montado a partir das duas linhas de colagem entre a alma e o flange utilizando uma placa pré-fabricada em tecido triaxial e um perfil sólido em tecido unidirecional.

Os filetes utilizados na colagem deve ter dimensões que possibilitem o fluxo contínuo e suave das tensões provenientes do casco. Esse tipo de perfil também também ser utilizado em vigas do convés principalmente em locais de grande concentração de esforços como o piso do convés de barcos ou helidecks.

Esses perfis são exemplos de como é necessário conhecer as propriedades dos materiais e as técnicas de diversos processos de fabricação.  Estas configurações podem facilitar a construção de elementos simples que tornam as embarcações muito mais eficientes do ponto de vista estrutural e do ponto de vista da linha de produção, o que é muito importante principalmente na produção seriada de embarcações.

Kits de Espuma

Não importa o processo de fabricação que o construtor opte por executar, a preparação e organização dos materiais é fundamental para o sucesso da laminação e qualidade da estrutura final. O planejamento e pré-corte de fibras e materiais de núcleos melhora a produtividade e reduz desperdícios inerentes ao processo de fabricação.

Nesse contexto, fornecedores de materiais de núcleo podem oferecer aos seus clientes kits de espuma personalizados para determinados projetos, com o conjunto de materiais de núcleo cortados de acordo com a necessidade do cliente.

O desenvolvimento do kit começa a partir do pedido do cliente, que então recebe visitas de uma equipe técnica que busca entender suas necessidades e características do molde e do laminado.  O protótipo do kit então é fabricado a partir da planificação da geometria do molde.

Um trabalho conjunto entre o cliente e o fornecedor ocorre para seleção adequada da espessura, densidade e groovings dos núcleos de espuma. Essas variáveis dependem do plano de laminação, do método de fabricação e da geometria final da peça e as duas partes devem compartilhar informações para conseguir alcançar o melhor resultado possível.

Evidentemente, modelos tridimensionais digitais da estrutura a ser construída facilitam muito o desenvolvimento do kit, mas é fundamental que o fornecedor verifique a compatibilidade do modelo digital com o molde real para que o protótipo seja o melhor possível.

As placas de um kit são numeradas e o cliente recebe um esquema indicando qual a localização de cada um dos elementos no molde final. Depois de receber o protótipo, os ajustes necessários são feitos e o kit final começa a ser produzido em série de acordo com a demanda do cliente.

O uso de kits torna o processo produtivo muito mais rápido e limpo, além de reduzir os desperdícios de matéria-prima e o consumo de resina, já que o processo de corte dos kits garante que os groovings sejam preservados de acordo com o especificado em projeto.

Sem dúvidas, a maior vantagem é a economia de horas de trabalho para montagem da laminação, que são muito significativas tanto na produção seriada de embarcações quanto em outras indústrias, como eólica, aeroespacial, de transportes, entre outras.