A História da Resina Poliéster

A resina poliéster é a matriz polimérica mais utilizada para construção de estruturas em materiais compostos, representando 80% do mercado de resinas termofixas. Suas propriedades mecânicas e resistência química são inferiores em comparação com resinas estervinílicas e epoxy, mas a facilidade de trabalhar com esse material e seu custo fazem com que seu uso seja muito popular.

As resinas poliéster são formadas a partir da reação de três elementos. Um ácido insaturado, responsável por fornecer os pontos reativos com ligações duplas, um glicol que proporciona um meio para aumentar a cadeia polimérica e um ácido saturado que determina o grau de espaçamento das moléculas entre ácidos insaturados.

Inicialmente quando este polímero foi desenvolvido a reação entre esses elementos formava um líquido de alta viscosidade com uma textura muito mais próximo de uma pasta do que de uma resina liquida que é utilizada para construção de embarcações. Com moléculas de baixa mobilidade, a resina era até capaz de reagir com os catalisadores para iniciar o processo de cura, mas era necessário muito tempo e temperaturas bem altas para que fosse possível vencer a baixa probabilidade de encontro de ligações insaturadas e completar o processo de cura.

O responsável pela descoberta que mudou a história da resina poliéster foi Carleton Ellis, um químico genial cujas descobertas construíram a base para a indústria petroquímica moderna. Ele é detentor de mais de 750 patentes que envolveram a criação da resina poliéster, da margarina, de tintas, vernizes e solventes.

Quando trabalhava na DuPont em 1933, Ellis misturou monômeros insaturados de estireno a esta pasta viscosa, que permitiram a formação de ligações cruzadas em taxas de vinte a trinta vezes mais rápidas e diminuíram significativamente a viscosidade do produto, aproximando-o da resina que se conhece hoje.

No entanto, os procedimentos adotados eram viáveis apenas em laboratório e não eram capazes de produzir um produto em escala suficiente para industrializar o produto. Esse avanço se iniciou a partir da II Guerra Mundial, quando os alemães ajustaram a formulação presente na patente de Ellis e desenvolveram a resina poliéster em quantidades viáveis para fabricação em massa do Messerschmitt BF109 também conhecido como ME109.

Entretanto, de alguma forma a inteligência britânica teve acesso às informações relacionadas aos ajustes realizados na patente de Ellis e as enviou para diversas empresas norte-americanas. Esse acontecimento, em combinação com o fato de que o monômero de estireno saiu do status de substância laboratorial e se tornou um commodity químico, possibilitou que a companhia American Cyaniamid se tornasse a primeira empresa a colocar o produto no mercado.

A invenção da resina poliéster e paralelamente da fibra de vidro, que também será contada nas próximas semanas, revolucionou o mundo dos materiais compostos ao possibilitar a construção de estruturas de matrizes poliméricas reforçadas com fibras sintéticas muito mais eficientes duráveis do que as construídas por aços.

A Diferença Entre Resistência e Rigidez

A resistência e a rigidez de materiais e estruturas são frequentemente citadas nos posts do blog como importantes requisitos de projeto. Uma ferramenta interessante para ajudar a esclarecer e definir esses conceitos é o diagrama de Tensão (σ) x Deformação (ε) de um material.

Gráfico 1. Diagrama Tensão x Deformação

O Gráfico 1 apresenta esse diagrama produzido a partir de um ensaio de tração, que consiste em aplicar uma carga axial que desenvolve um deslocamento constante em um corpo de prova. A tensão σ no corpo de prova é determinada a partir da razão entre a carga P necessária para impor esse deslocamento pela área A da seção transversal do corpo de prova, ou seja:

Já a deformação ε é a razão entre o comprimento Li do corpo de prova em um determinado momento pelo comprimento inicial Lo da amostra, ou seja:

A resistência de um material é a máxima tensão que ele pode suportar antes que um determinado fenômeno ocorra. O Gráfico 1 destaca três eventos importantes demarcados pela resistência ao escoamento σe, pela resistência máxima σu e pela resistência à ruptura σr.

A resistência ao escoamento σe é amplamente utilizada como critério de projeto porque representa o limite entre dois tipos de comportamento de um material, o elástico e o inelástico. Abaixo da tensão de escoamento, o corpo de prova se comporta de maneira linear e a tensão aplicada é proporcional à deformação causada respeitando a Lei de Hooke:

Até esse limite, qualquer deformação pode ser desfeita se a carga parar de agir no corpo de prova. Após o limite, as deformações são permanentes e comprometem a geometria do corpo de prova.

Depois de a carga aplicada causar uma tensão maior do que a resistência ao escoamento, o crescimento da tensão acontece de maneira mais lenta até alcançar a tensão máxima σu e, após esse ponto, a carga necessária para continuar a deformá-lo em uma taxa constante decai até a tensão de ruptura σr. Como deformações permanentes não são desejadas em nenhuma estrutura, normalmente os projetistas trabalham dentro do limite de escoamento e com uma certa margem de segurança.

Já a rigidez de um material pode ser definida como sua resistência à deformação, sendo representada pelo módulo de elasticidade E que no Gráfico 1 aparece como o coeficiente angular da reta que caracteriza o comportamento do material na região elástica. Manipulando a Lei de Hooke, podemos claramente observar que quanto maior a rigidez do material, menor é a deformação que uma determinada tensão causará:

Já a rigidez à flexão de uma estrutura é o produto entre o módulo de elasticidade E do material que a compõe com o momento de inércia I da sua seção transversal, de acordo com a equação:

O módulo de elasticidade E de um laminado é uma propriedade mecânica que pode ser determinada por meio de ensaios mecânicas ou estimado a partir das propriedades de seus constituintes por meio da micromecânica. Já o momento de inércia I da seção transversal depende da geometria da estrutura, aumentando exponencialmente quanto maior for a espessura dessa seção.

Em suma, a resistência de um material diz respeito à quanta tensão ele é capaz de suportar antes de escoar ou se romper. A rigidez de um material pode ser quantificada por seu módulo de elasticidade, representando fisicamente a resistência que um material tem a deformação. Já a rigidez à flexão de uma estrutura depende não só da rigidez do material que a compõe, mas também de sua geometria.

Tipos de Fibra de Vidro

Quando se pensa na construção de barcos utilizando materiais compostos a fibra de vidro é a primeira opção de reforço na mente de projetistas e construtores por conta de seu excelente custo benefício e sua ampla versatilidade e variedade de configurações de trama.

Como ela é comercializada em formas diferentes de reforço que variam desde fios roving e manta picada até os eficientes tecidos multiaxiais, é possível utilizar as fibras de vidro em processos de alto volume de produção, como o spray-up, até aqueles que priorizam alto teor de fibras e pequena quantidade de vazios (microbolhas), como o prepreg.

A maior parte das estruturas náuticas é construída com fibras de vidro do tipo E, reforço que foi originalmente desenvolvido para ser utilizado como isolamento elétrico e a nomenclatura remete a “Eletrical Glass”. Em sua forma original, essa fibra apresenta excelentes propriedades mecânicas em relação à tração e flexão.

No entanto, quando é produzida em grandes volumes com filamentos de diâmetros que variam entre 18 a 22 mícrons, metade das propriedades mecânicas são perdidas. Isso ocorre principalmente por conta da abrasão provocada pelo contato entre os filamentos durante o processamento.

Mesmo com todas essas questões, as fibras de vidro do tipo E representam a opção de melhor custo benefício para os construtores de barcos. No entanto, com a evolução do produto as indústrias como a aeronáutica e eólica tinham vários projetos para utilizar as fibras de vidro mas precisavam desempenhos melhores e, por essa razão, começaram a desenvolver as fibras do tipo R e S, que posteriormente também ganharam algum espaço em aplicações náuticas que precisam de um desempenho mecânico melhor do que as fibras do tipo E são capazes de proporcionar.

As diferenças das fibras R e S começam na composição química que possui um teor de silíca e alumínio maior, o que acaba tornando as propriedades mecânicas de 20 a 40% superiores as fibras do tipo E.

Outra característica de extrema importância é o diâmetro dos filamentos, que é cerca de metade dos filamentos de fibra de vidro E. Isso significa que com o mesmo peso, as fibras R e S apresentam o dobro de área superficial o que aumenta a área de contato com a matriz polimérica e a aderência entre os elementos do laminado por consequência. Além disso, esse menor diâmetro permite uma maior compactação e possibilita o aumento do teor de fibras e melhora nas propriedades mecânicas do laminado.

As fibras do tipo R e S possuem um custo mais alto, mas são opções à disposição dos construtores com propriedades melhores e densidades menores, o que torna seu comportamento mecânico mais eficiente do que as fibras do tipo E.

A História do Fundo em V

No concepção do projeto de embarcações de planeio, a distribuição do ângulo do fundo na popa (deadrise) ao longo do comprimento do barco é uma das primeiras variáveis a serem estimadas, apresentando forte influência no comportamento da embarcação como um todo. Ela define o formato do fundo em “V”, um conceito de cascos de barcos a motor que permanece constante há 70 anos em uma indústria que está constantemente buscando inovações.  

O responsável pela criação do conceito do fundo em “V” foi o americano Charles Raymond Hunt. Além de um projetista náutico excepcional, Ray Hunt era mundialmente conhecido como velejador e medalhista olímpico. Apesar de preferir ficar longe dos holofotes, seu portfólio de incríveis projetos de veleiros e lanchas coleciona títulos em campeonatos internacionais. Embora ele não tenha estudado nada além do ensino médio, Hunt possuía uma profunda compreensão de como o mar se comportava e como era a maneira mais rápida de se mover através das águas e do vento.  

Foi no ano de 1950 que ele desenvolveu um projeto que deixou seu legado na história. Até essa data, todas as embarcações de planeio possuíam fundos chatos ou muito redondos. Observando o desenho das asas de aviões que eram abertas em um ângulo “V”, Hunt projetou o primeiro barco com um formato “V” bem pronunciado na popa.

A construção da primeira embarcação desse tipo foi batizada de Sea Blitz e construída em Boston Harbour.O resultado foi excepcional, já que o barco conseguia navegar em águas agitadas e manter uma excelente média de velocidade. Nos anos seguintes, a famosa marca Boston Whaler produziu um casco com este mesmo fundo com um conceito insubmersível e de desenho único.

Foi em 1960 que Ray Hunt provou para o mundo a eficiência do V Bottom, quando construiu o casco da lancha Moppie com ângulo de fundo (deadrise) de 24° junto com o piloto Dick Bertram, da Bertram Yachts. Eles entraram para história durante a Miami-Nassau Race, um evento de travessia da Florida até as Bahamas que foi um divisor de águas na história dos barcos a motor.

Moppie mostrou uma habilidade excepcional para cortar as enormes ondas de 2 a 3 metros que ocorreram durante a prova e enfrentar ventos de 30 nós durante quase todas as 180 milhas de distância da travessia. A embarcação estabeleceu um novo recorde ao completar a prova em oito horas de navegação e mudou o formato dos barcos a motor construídos nas próximas décadas. O segundo lugar alcançou a linha de chegada apenas duas horas depois, sendo que apenas três foram capazes de terminar o evento com aquelas condições de mar.

Até os dias de hoje surgem novas ideias de como projetar o fundo de barcos a motor, mas as espirais de projeto sempre acabam caindo no conceito do casco em formato “V” profundo, com ângulo de deadrise aumentando da popa a proa da embarcação.

Ray Hunt criou há 70 anos um conceito que domina os projetos e construções de barcos a motor até hoje, colocando seu nome na história como um dos projetistas mais inovadores da náutica. Apesar de não ter sido capaz de patentear sua invenção, talvez o maior tributo prestado a Hunt seja a longevidade do fundo em “V” em uma indústria, ou até mesmo em um mundo, que sempre está em busca de mudanças frequentes e contínuas.

Uso de Pressão com Bolsa Dupla

A infusão de grandes estruturas como cascos e conveses por meio da infusão sempre experimenta uma queda de pressão depois que a resina é impregnada em toda a área do laminado. Esse fenômeno pode prejudicar a compactação do materiais e criar um laminado com maior teor de resina, além de prejudicar a retirada do ar preso dentro do laminado possibilitando a criação de microbolhas.  

Uma solução para esse problema foi elaborada pela Boeing e pela NASA que buscavam a fabricação de laminados com qualidade aeroespacial sem precisar do uso de autoclaves. Eles adaptaram procedimentos utilizados para compactação de prepregs já na década de 1980.

A ideia é utilizar duas bolsas de vácuo independentes durante a impregnação do laminado. Uma delas é responsável por criar o gradiente de pressão responsável por realizar a “sucção” da resina para dentro do laminado e a outra é responsável pela compactação dos materiais. O esquema de laminação é ilustrado pela figura abaixo.

A princípio, a infusão a vácuo deve ser montada da maneira usual como é indicado no post sobre o tema. A segunda bolsa é montada em um perímetro externo que envolve toda a estrutura da infusão, sendo vedada por uma segunda linha de tacky tape. É importante garantir a vedação da primeira bolsa antes da aplicação da segunda para impedir que o sistema apresente um vazamento e as bolsas atuem como um só sistema de vácuo. Evidentemente é necessário realizar um drop test também após a montagem da segunda bolsa e antes da abertura das linhas de resina.

Entre as duas bolsas é necessário que exista um meio para permitir a distribuição homogênea do vácuo e impedir que ocorra o colapso de uma bolsa sobre a outra, o que faria com que perdessem suas funções. Consumíveis como uma camada de breather ou flow media exercem muito bem essa função.

Se essa abordagem for bem e executada e for capaz de manter a independência das duas bolsas, ela é capaz de produzir laminados com teores de fibra de até 70%, o que é uma grande vantagem para as propriedades mecânicas de estruturas construídas em composites. O teor de vazios, ou a quantidade de microbolhas, também é baixo, diminuindo os pontos de concentração de tensão criados durante a consolidação dos materiais compostos.

Estratégias de Infusão – Parte 2

No post anterior foram apresentadas três estratégias de infusão, começando com point injection e terminando com a estratégia de edge injection com uma linha de resina posicionada no centro do painel simulado, o que diminui o tempo de infusão mas ainda não é capaz de formar frentes de resina que cheguem de forma homogêneas nas linhas de vácuo.

Para alcançar esse objetivo, o construtor pode recorrer ao uso de branches, que são linhas secundárias de menor diâmetro responsáveis pela distribuição da resina que entra pela linha principal. A Figura 1 apresenta uma estratégia de infusão com a linha de resina posicionada no centro do painel, mas agora com um branch central.

Figura 1. Linha principal central com branch central

A adição dessa linha secundária no centro da linha principal causa um aumento do fluxo de resina em direção ao centro das arestas da placa, o que pode causar a saturação das linha de vácuo e fazer com que os vértices não recebam resina suficiente.

A Figura 2 apresenta o comportamento do fluxo de resina quando são adicionados branches na extremidade da linha principal de resina. É possível observar que a frente de resina chega às arestas da placa de forma mais regular que no exemplo anterior.

Figura 2. Linha principal central com branches nas extremidades

A Figura 3 apresenta a outra abordagem do uso de branches, com eles igualmente espaçados sobre a linha principal de resina, fazendo com que o fluxo de resina avance de forma mais controlada em direção às quatro arestas da placa. É possível controlar o comprimento da linha principal e das secundárias de acordo com as dimensões da peça a ser construída pela infusão a vácuo. 

Figura 3. Linha principal com branches distribuídos

Figura 4. Peripheral injection

A Figura 4 apresenta uma estratégia diferente, onde todas as arestas são munidas de linhas de entrada de resina e o centro do painel possui uma saída de vácuo. Dessa forma, a frente de resina se comporta de maneira bem homogênea durante toda a infusão e molha rapidamente toda a peça. Ao utilizar essa abordagem, é importante que o construtor mantenha as linhas de resina independentes em cada aresta para que o fornecimento de resina seja igual de todos os lados.

Analisando todas as estratégias, apresentadas nesse post e no da semana anterior, é possível perceber que além de todas as variáveis apresentadas no post sobre teste de permeabilidade, o tempo de infusão ainda pode variar em função da estratégia utilizada. Dominando esses conceitos, o construtor pode tornar seu processo ainda mais eficiente.

Mais informações sobre esse tema e sobre como aplicar esse conceito na construção de embarcações estão presentes no livro Processo de Infusão a Vácuo.

Estratégias de Infusão – Parte 1

O processo de infusão a vácuo consegue entregar o laminado com teor de fibra de cerca de 60% e uma quantidade de microbolhas reduzidas em comparação com os processos manuais e de laminação por vacuum bag. No entanto, é necessário ter um conhecimento prévio para conseguir planejar o processo de maneira adequada.

A maior preocupação do construtor durante o processo de infusão a vácuo é fazer com que a resina permeie todos os reforços de fibra antes de atingir o ponto de gel. Para isso ele deve planejar cuidadosamente o posicionamento das linhas de entrada de resina e de saída de vácuo, definindo a chamada estratégia de infusão.

Para evitar desperdícios e a perda de pressão durante o processo, é sempre interessante que todas as frentes de resina atinjam as linhas de vácuo simultaneamente logo antes do ponto de gel. Existem uma infinidade de maneiras de realizar a infusão de uma embarcação, mas basicamente todas as estratégias de infusão, seja qual for o nível de complexidade, podem ser discretizadas e simplificadas pelos métodos mostrados nos próximos posts do blog, desenvolvidos a partir de flow models realizados em placas de largura L e comprimento 2L.

A primeira estratégia é chamada de point injection, onde a entrada de resina é um ponto na aresta inferior esquerda da Figura 1 e a linha de vácuo é posicionada em toda a aresta na direita. É possível notar que a frente de resina avança de forma radial a partir do ponto de injeção. Porém, a partir de certo ponto, a frente de resina tende a avançar de forma linear conforme o avanço da impregnação.

Figura 1. Point injection

A Figura 2 apresenta a estratégia de edge injection, que não trabalha com um ponto de entrada de resina e sim com uma linha de resina, que na ilustração está posicionada na aresta inferior da placa, enquanto a linha de vácuo está posicionada na aresta oposta.

Figura 2. Edge injection

A resina avança de forma bastante linear e constante. Nesse caso, o construtor deve se atentar para a distância que a resina deve percorrer e se, segundo os resultados do teste de permeabilidade, ela consegue alcançar a linha de vácuo antes de seu gel time.

Se a distância for muito grande e a permeabilidade muito baixa, é possível posicionar a linha de resina no centro do painel e criar linhas de vácuo em todas as arestas da placa, como indicado na Figura 3, fazendo com que o caminho que a resina tenha a percorrer seja muito menor.

Figura 3. Edge injection com linha de resina central

Com essa estratégia a frente de resina avança de forma rápida do centro em direção às arestas da placa, atingindo primeiro o centro das arestas. Ao utilizar essa abordagem, o construtor deve utilizar linhas de vácuo independentes de forma que não sature toda a linha quando a resina alcance uma das arestas. Isso faria com que toda a laminação perdesse vácuo e comprometeria a compactação do laminado, facilitando a criação de microbolhas e diminuindo o teor de fibra.

Apesar de minimizar o problema do tempo de impregnação, a frente de resina ainda encontra as arestas das placas de maneira muito desigual, longe do ideal mencionado de que todas as frentes cheguem ao mesmo tempo na linha de vácuo momentos antes do fim do gel time. O post da próxima semana abordará estratégias que buscam tornar constante o fluxo de resina em todas as suas frentes.

Construção Sandwich com Prepregs

O post da última semana mostrou as razões pelas quais os tecidos prepreg são capazes de produzir laminados com alto teor de fibra com seus processos de cura que necessitam de condições controladas de pressão e temperatura. Suas excelentes propriedades mecânicas, alto teor de fibra e baixa quantidade de vazios (microbolhas) fazem com que sejam uma excelente opção para construção das faces de estruturas sandwich de alta performance.  

Estruturas sandwich são construções bastantes discutidas aqui no blog e são compostas de duas faces de laminados de alta rigidez e resistência espaçadas por um material de núcleo de baixa densidade com alta resistência ao cisalhamento e à compressão. O que garante a eficiência global da estrutura é a junta adesiva, responsável por transferir os esforços das faces para o material de núcleo e vice-versa. O conceito de sandwich busca aumentar exponencialmente a rigidez à flexão sem agregar peso à estrutura, como é possível entender por meio do vídeo sobre Materiais Sandwich publicado no canal da Barracuda Composites.

Na construção de embarcações, as espumas PVC são amplamente utilizadas como materiais de núcleo por conta de suas excelentes propriedades específicas e superfícies com células fechadas que absorvem pouca resina e não degradam com a presença de água e umidade. No entanto, a maior parte das espumas de PVC que são largamente utilizadas em barcos de recreio suportam temperaturas de processamento até 90°C e se for necessário mais do que isso para realizar a cura das faces de prepreg, é provável que aconteçam deformações permanentes e perda de propriedades mecânicas no laminado.

Para construção sandwich com faces de prepreg existem espumas PVC desenvolvidas para suportar temperaturas de processamento de até 120°C no entanto, a opção mais comum é utilizar núcleos honeycomb de aramida (Nomex) que suportam altas temperaturas e possuem as maiores razões entre resistência ao cisalhamento, compressão e baixa densidade (48-64-96 kg/m³) fazendo com que seja possível alcançar maiores índices de eficiência estrutural.

Como a superfície de colagem do honeycomb contra as faces é bem pequena, é necessário utilizar uma junta adesiva com bastante resiliência e poder de adesão. O papel da junta adesiva para este tipo de laminado sandwich é realizado por filmes adesivos com maior capacidade de alongamento e menor viscosidade que as resinas utilizadas no prepreg, mas que possuem o mesmo regime de cura.

Os filmes adesivos a base de adesivo epoxy normalmente são impregnados à uma fina camada de fibra de vidro de 20 g/m² e possuem gramaturas que variam entre 250 e 400 g/m². As menores gramaturas normalmente são utilizadas para colagem de honeycombs, enquanto as maiores são dedicadas à colagem de espumas PVC.

A construção das estruturas sandwich com faces de prepreg pode apresentar uma abordagem direta, realizando a cura de todos elementos de uma só vez, ou dividindo o processo em duas ou três etapas. A abordagem direta garante um certo nível de produtividade ao diminuir o tempo empregado na fabricação, mas ela não costuma ser utilizada na construção de estruturas com geometrias complexas.

O processo em duas etapas consiste no posicionamento da primeira face de prepreg, do filme adesivo e do material de núcleo. Esses elementos são submetidos às condições de pressão e temperatura necessárias para cura antes de outra camada de adesivo e a outra face serem posicionadas e curadas. As rampas de cura são as mesmas comentadas no artigo anterior do blog e podem variar entre 80 e 120°C.  Quanto maior a temperatura de cura, menor o tempo para o laminado atingir as propriedades ideais para ser manuseado.

Na operação em três partes, o laminado de prepreg é aplicado sobre o molde e curado. O material de núcleo é então colocado sobre o prepreg curado e o filme adesivo é curado. Finalmente, a segunda camada é colocada sobre o material sandwich e curada em uma terceira operação. Se necessário, todo o laminado depois pode ser pós-curado e, para isso, deve sofrer um aumento de temperatura constante e estar sobre uma pressão de vácuo de 1 atm.

A compactação é outro processo importante na construção de laminados sólidos ou sandwich em prepreg que possuem múltiplas camadas de reforços. Esse processo nada mais é que a aplicação de pressão de vácuo para consolidar as camadas em seus lugares e remover o ar entre as interfaces antes do processo de cura. Em estruturas críticas, é necessário realizar compactação pelo menos a cada três camadas de 300 g/m² durante quatro horas a uma pressão de vácuo de 0,9 atm. Mesmo não sendo necessário o uso de temperatura, a remoção de ar entre as camadas pode ser facilitada se o molde for aquecido a uma temperatura de 40°C. É importante notar que a estrutura dos laminados de prepreg é extremamente compacta com alto teor de fibras então a passagem de ar entre elas é sempre difícil e por isto é necessário remover todo possível espaço entre os filamentos das fibras antes de se iniciar a cura final.

O custo dos prepregs e de toda a estrutura necessária para sua armazenagem e cura, faz com que sua aplicação esteja restrita para projetos que priorizam o alto desempenho em relação ao custo. Embarcações como os veleiros desenvolvidos para a regata The Ocean Race se beneficiam muito da eficiência alcançada por sandwich de prepregs com núcleos de honeycomb, além do nível de controle do processo que esse tipo de abordagem de fabricação permite.

O Uso de Prepregs

Tecidos pré-impregnados construídos a partir de fibras secas e impregnadas com resinas de cura a quente são chamados de prepreg. Seu alto custo se deve às matérias-primas que incluem normalmente fibras de carbono e resinas epoxy, além da infraestrutura necessária para armazenamento dos tecidos em temperaturas de -18°C e para realizar a cura em temperaturas que podem chegar a 150°C.  

Os prepregs são fabricados com o auxílio de um impregnador que deposita e pressiona a resina sobre as fibras em condições controladas que permitem inserir a quantidade de resina suficiente para garantir a proteção e transferência de esforços eficiente para as fibras, sem quantidades excessivas que iriam enfraquecer o laminado e favorecer o aparecimento de vazios (micro bolhas).

Diferente de outros tipos de processos de laminação, é comum que os prepregs sejam caracterizados pelo teor de resina que o material possui e não pelo teor de fibras. É comum que esse valor fique em torno de 35%, o que significa que o teor de fibra em peso é equivalente a 65%, superior a qualquer outro processo de laminação já descrito no blog. Como visto no post de micromecânica, quanto maior o teor de fibras e menor o de resina, melhores serão as propriedades mecânicas do laminado.

É muito como que os prepregs sejam feitos de fibras de carbono impregnadas com resinas epoxy combinadas com endurecedores de aminas aromáticas, capazes de formar estágios de cura parcial.

Assim que foram realizadas as primeiras aplicações de prepreg na indústria aeronáutica, as resinas utilizadas curavam em temperaturas de processamento que variavam entre 120 e 150°C, com pressões de 3 atm. Atualmente existem opções relativamente mais eficientes no mercado onde os prepregs podem ser processadas em temperaturas entre 65°C e 80°C e com pressões de 1 atm, o que facilita o uso de prepregs em embarcações de alto desempenho.

Uma grande vantagem do processo também é a facilidade de manipular o material durante a laminação. Depois de retirar os produtos do armazenamento, é relativamente fácil posicioná-los nos moldes, onde eles permanecem na posição desejada por apresentarem uma certa adesividade em suas superfícies.

Existem dois tipos de prepreg que merecem ser mencionados, começando com aqueles que são projetados para possuir a quantidade exata de resina necessária para o laminado final e os que precisam passar por um processo chamado de sangramento, onde uma quantidade de resina é retirada do laminado por meio da aplicação de vácuo durante o processo de cura. Em laminados de baixa espessura, essa quantidade de resina não passa de 3%.

A escolha entre um tipo e outro possui influência nos consumíveis utilizados durante o processo de consolidação e cura do prepreg. Acima das camadas estruturais é posicionada uma camada de tecido desmoldante, conhecido como peel ply, e um filme perfurado em sequência, antes de uma camada de filme absorvente e da bolsa de vácuo.

A área aberta do filme perfurado é o que determinará a quantidade de resina que será retirada do laminado. Se não é necessário realizar o processo de sangramento, deve-se utilizar um filme com baixa perfuração com 0,1% de área aberta. Em laminados finos de 1 a 2 mm onde se deseja retirar até 2% da resina do laminado, é indicado que o filme perfurado tenha até 0,5% da área aberta. 

Os prepregs que passam pelo processo de sangramento apresentam a vantagem de possibilitar a remoção de parte do ar aprisionado dentro laminado durante a etapa de retirada do excesso de resina. Um laminado com menos ar aprisionado apresenta menor teor de vazios e, portanto, maior qualidade.

Assim como os materiais consumíveis, o molde utilizado para construção de estruturas em prepreg deve suportar o ciclo de temperatura ao qual o material será submetido durante a cura. Idealmente, deve ter o mesmo coeficiente de dilatação do laminado e para isso, deve ser feito a partir do mesmo material da peça que se pretende construir nele. A taxa de aquecimento para maior parte dos sistemas deve ser de 1°C/min, fazendo com que as características de escoamento da resina sejam otimizadas.

Para realizar a cura da resina em condições de pressão e temperatura controladas, é necessário utilizar estufas e bombas de vácuo ou autoclaves, no caso de pressões acima de 1 atm. Como no processo de pós-cura, é necessário que o aquecimento da peça seja de forma gradual a homogênea.

O post da próxima semana abordará os procedimentos para construção de estruturas sandwich com prepregs. Para saber mais sobre esse tema, é possível encontrar mais informações no livro Processo de Infusão a Vácuo em Composites.

O Uso da Micromecânica

Frequentemente comentamos sobre as excelentes propriedades mecânicas e a eficiência dos materiais compostos nos posts do blog, assim como o quanto é importante sempre tentar fabricar um laminado com o mais alto teor de fibras possível com o a menor quantidade de vazios.

No entanto, estimar as propriedades mecânicas de laminados na prática não é um processo assim tão fácil. Existem uma infinidade de variáveis a serem consideradas, começando pelo tipo dos materiais, pelo processo de laminação, pressão de moldagem, temperatura e condições ambientais de cura, umidade, além do processo de pós-cura. Processos mais convencionais, que ainda são utilizados pela indústria, como o spray-up e a laminação manual dependem fortemente até mesmo da habilidade do laminador.

Não é nenhum preciosismo afirmar que só é possível ter certeza das propriedades mecânicas de um laminado depois de que ele for construído e testado em ensaios de tração, compressão, flexão e cisalhamento. No entanto, esse é um trabalho caro e muito longe da realidade dos construtores amadores de embarcações.

Isso não significa que esses construtores devam projetar e construir às cegas ou que devam apenas acreditar em experiências anteriores. A micromecânica se apresenta como uma ferramenta de projeto capaz de estimar as propriedades de uma lâmina de material composto com base nas propriedades dos elementos que a constituem, ou seja, a fibra e a resina.

Figura 1. Lâmina de composite

Uma lâmina de material composto é formada por uma matriz polimérica homogênea com adesão perfeita a um conjunto de fibras de reforço perfeitamente alinhadas, espaçadas e contínuas por todo o comprimento do painel. Um conjunto de lâminas como o da Figura 1 forma um laminado e um conjunto de laminados forma uma estrutura, que pode ser o casco de uma embarcação, uma pá de geração de energia eólica ou a fuselagem de uma aeronave, por exemplo.

As características físicas e mecânicas das fibras e resinas estão amplamente disponíveis para os construtores e projetistas em uma ficha disponibilizada pelos fabricantes com as especificações dos materiais, normalmente conhecida como datasheet. A micromecânica permite a utilização dessas informações como forma de prever o comportamento mecânico do material composto construído com esses elementos, o que é uma grande economia de tempo e dinheiro em comparação com a realização de ensaios mecânicos.

É importante ressaltar que os resultados obtidos através dessa ferramenta são apenas estimativas, uma vez que as hipóteses de matriz homogênea e sem vazios, além de adesão perfeita entre fibras e resina, não são possíveis em condições reais. No entanto, as estimativas produzidas são bastante interessantes, além de trabalhar com um conjunto muito simples de equações.

A primeira é a Equação 1 apresentada abaixo, que permite estimar propriedades físicas como a densidade, assim como propriedades mecânicas na direção longitudinal da Figura 1, como a resistência à tração σ e o módulo de elasticidade longitudinal E1:

Equação 1. Propriedades longitudinais dos composites

A ideia da expressão é que uma propriedade do laminado pode ser estimada a partir da média ponderada das propriedades da fibra Pf e da matriz Pm. O elemento ponderador é a fração volumétrica de fibra vf e de resina vm. A fração volumétrica de um elemento é o volume que ele ocupa no laminado dividido pelo volume total do laminado, ou seja:

Equação 2. Cálculo da fração volumétrica

A fração volumétrica, então, é uma propriedade adimensional obtida a partir da razão entre dois volumes. Na prática não é fácil medir volumes com precisão, principalmente quando se fala das fibras. O post Fração em Peso e Fração em Volume aprofunda essa discussão e mostra como converter a fração mássica, facilmente obtida na realidade de um estaleiro, em fração volumétrica.

As propriedades mecânicas das fibras são sempre superiores em relação às das resinas e é por essa razão que sempre se busca altos teores de fibra. A quantidade de resina ideal é apenas aquela suficiente para impregnar completamente os filamentos de fibra, fornecendo proteção e sendo capaz de transferir os esforços mecânicos.

Outra característica bastante citada no blog é o fato de que os materiais compostos apresentam resistências mecânicas diferentes em diferentes direções. Por definição, eles são ortotrópicos, o que significa que apresentam propriedades desiguais nas direções longitudinal e transversal. Olhando para Figura 1, é fácil entender o porquê.

Se uma força axial é aplicada na direção 1, as fibras conseguem realizar uma excelente contribuição na resistência e rigidez do laminado. Quando a força axial é aplicada na direção 2, as fibras já não estão com a carga aplicada em sua direção preferencial e a Equação 1 não pode ser aplicada. É possível estimar as propriedades mecânicas na direção 2 com a seguinte expressão:

Equação 3. Propriedades transversais dos composites

As duas propriedades mais importantes que podem ser estimadas a partir da Equação 3 são o módulo de elasticidade transversal E2 e o módulo de cisalhamento G12.

A micromecânica é uma ferramenta simples, de fácil aplicação e baixo custo a disposição dos projetistas e construtores de materiais compostos. Além de fornecer estimativas das propriedades físicas e mecânicas aceitáveis para os laminados antes mesmo que eles sejam construídos, ela é capaz de ilustrar algumas variáveis importantes no projeto de estruturas e na escolha do processo produtivo.

Para determinar com melhor precisão as características dos laminados, é necessário construir e ensaiar amostras dos materiais para verificar como eles se comportam em condições reais. No livro Processo de Infusão a Vácuo em Composites é possível ler mais sobre micromecânica e encontrar dados de propriedades mecânicas de laminados reais que foram ensaiados e podem ser utilizados para construção de sua embarcação.

Pós-Cura de Resinas Termofixas

O último post do blog abordou o tema de cura das resinas termofixas e destacou a importância de sempre buscar a cura total durante o processo de laminação, apesar disso se tornar complicado ao passo que conforme as ligações se formam, o movimento das cadeias poliméricas é limitado e o avanço da cura é restringido.

Se a laminação for realizada em temperaturas ambientes de cerca de 25°C e utilizar uma proporção adequada de catalisadores ou endurecedores, é comum que o grau de interligação alcançado varie entre 80% e 90%. Depois de um período de dois a quatro dias, o grau de cura pode chegar sozinho até cerca de 95%, mas não chegará perto do ideal de 100%. Para isso, é necessário adicionar uma fonte externa de calor para que seja possível se realizar o processo de pós-cura.

Existem algumas maneiras para determinar qual é o grau de cura de um laminado, como pela exotermia ou estimando o estireno residual no caso de resinas poliéster. No entanto, o método mais simples e que mais se adequa à realidade de um estaleiro é a determinação do grau de cura por meio da Dureza Barcol. Embora a dureza final não determine fielmente o grau de interligação, o método é simples e pode ser implementado na linha de produção de qualquer fábrica.  O durômetro Barcol mede a resistência que a resina oferece à penetração de uma agulha padrão comprimida com uma pressão normalizada. Quanto maior a dureza, maior o grau de interligação.

Uma característica chave tanto do processo de cura como das condições de operação da resina é a temperatura de transição vítrea, normalmente chamada de TG. Essa temperatura marca o ponto que divide o estado em que as ligações cruzadas continuam a se formar e o de repouso molecular. Acima da TG as moléculas ainda podem se mover, abaixo elas ficam em repouso e o processo de cura não evolui.

Além disso, quando colocada em temperaturas acima da TG durante o ciclo de vida do laminado, a resina adquire um aspecto borrachoso. Isso é particularmente preocupante em resinas epoxy com baixas temperaturas de transição vítrea, que podem ser alcançadas simplesmente pelo calor gerado durante períodos de exposição solar, fazendo com que os laminados sofram um tipo de “amolecimento”.

O processo de pós-cura é capaz de aumentar a TG ao mesmo tempo que permite aumento do grau de interligação da resina, possibilitando que o grau de cura se aproxime de patamares próximos a 100%. O princípio do processo é que, após o processo de vitrificação que impede o progresso do processo de cura, uma fonte externa fornece calor o suficiente para que o laminado seja aquecido acima da TG para que as interligações sejam retomadas até alcançarem outro patamar de vitrificação, caracterizado por outra temperatura de transição vítrea. Então outro aquecimento avança a interligação para um patamar ainda mais alto e assim sucessivamente até a cura plena.

É sempre ideal seguir as orientações dos fabricantes das resinas termofixas, mas em geral o processo de pós-cura é feito somente após que todo o ciclo de cura em temperatura ambiente acontece. Se o método de laminação utilizado tiver o auxílio de vácuo, este deve ser mantido antes e durante a pós-cura, que se inicia apenas após o laminado estar em temperatura ambiente por duas horas.

É necessário então elevar a temperatura de forma controlada, com uma taxa de aproximadamente 1°C/min. Quando alcançar TG, deve-se estabilizar a temperatura por uma hora para que a temperatura superficial da peça se estabilize. Depois desse período, inicia-se novamente um período de subida de 1°C/min. Ao chegar em um novo patamar de vibração, deve-se estabilizar a temperatura por 5 horas e, após esse período, é interessante voltar a temperatura ambiente também com uma taxa de resfriamento entre 1°C/min e 2°C/min, se a infraestrutura permitir. O ciclo de temperatura de um processo de pós-cura de uma resina epoxy é apresentado no gráfico abaixo.

A fonte externa que fornece calor pode ser uma manta térmica ou uma estufa. Alguns construtores tentam fazer pós-cura por meio da exposição solar, mas esse tipo de procedimento não fornece o controle nem o tempo de exposição necessários a uma temperatura alta e constante o suficiente para realização do processo descrito.

O objetivo do processo de pós-cura, portanto, é aumentar o grau de cura das resinas termofixas que exercem o papel de matriz nos materiais compostos. Por conta disso, é capaz de melhorar as propriedades mecânicas dos laminados, além de aumentar a faixa de temperatura de operações do laminados ao aumentar a temperatura de transição vítrea, bastante conhecida como TG.

Cura de Resinas Termofixas

O processo de cura de resinas termofixas pode ser definido como um fenômeno exotérmico que representa a transformação da resina do líquido viscoso em que ela é comercializada para o estado sólido em que ela exerce o papel da matriz polimérica responsável por transferir os esforços mecânicos às fibras de alta rigidez e resistência.

Sejam amadoras ou profissionais, as construções de embarcações em materiais compostos utilizam majoritariamente as resinas poliéster, estervinílicas e epoxy. As duas primeiras possuem longas cadeias poliméricas diluídas em monômetros de estireno e apresentam o mesmo mecanismo de cura ativada por catalisadores por esse motivo, enquanto a resina epoxy trabalha com endurecedores.

As resinas poliéster e estervinílicas iniciam seu processo de cura a partir da adição de um catalisador de peróxido à sua composição, que tem a função de quebrar as ligações insaturadas das cadeias poliméricas e dos estirenos, formando radicais livres altamente energizados e fornecendo calor à mistura. Calor causa ainda mais agitação das moléculas, acelerando o processo de cura.

Esses radicais livres podem encontrar outros monômeros de estireno ou polímeros de poliéster insaturado. É muito mais provável que eles encontrem monômeros de estireno e formem ligações cruzadas usando esse elemento, que antes fazia o papel de diluente, como uma ponte molecular entre cadeias de polímeros.

A formação dessas ligações cruzadas, que também são chamadas de cross-link, acabam restringindo os movimentos da solução que sai do estado líquido e passa para o estado de gel. O intervalo em que é possível trabalhar com a resina no processo de laminação é compreendido entre o momento da adição do catalisador até a passagem da solução para o estado de gel e é chamado de gel time.

Os catalisadores de peróxido são utilizados em pequenas quantidades, em concentrações que variam entre 0,5% e 2% do peso total de resina. Dependendo da temperatura da resina, eles são capazes de fornecer um gel time entre 20 e 30 minutos, mas com o uso de inibidores é possível alcançar um tempo de trabalho de até 45 minutos.

Esse intervalo pode variar entre 15 minutos e algumas horas quando se trabalha com resinas epoxy, dependendo do endurecedor com o qual se trabalha. Diferente dos catalisadores que possuem apenas a função de quebrar as ligações saturadas e formar radicais livres, os endurecedores utilizados para cura das resinas epoxy fazem parte da composição final da resina. A proporção da mistura também é completamente diferente, e resinas de laminação de alto desempenho acabam por ter proporções de resina e endurecedor em torno de 100:33 ou 100: 25 em peso.

Existem diversos tipos de endurecedores que controlam o gel time e as propriedades finais do laminado, assim como a cinética de cura e o ciclo de processamento da resina. Vale destacar os agentes de cura amínicos e os anidros.

Os agentes amínicos são divididos em aminas alifáticas e aminas aromáticas. As aminas alifáticas são altamente reativas e se encontram em estado líquido e volátil em temperatura ambiente, onde apresentam tempo de gel inferior a 60 minutos. Já as aminas aromáticas são endurecedores de cura a quente bem menos reativos que precisam de temperaturas entre 150°C e 180°C, permitindo um tempo de processamento bem maior. Como podem formar estágios de cura parcial, as aminas aromáticas são bastante utilizadas para a manufatura de prepregs.

Os agentes de cura anidros possuem reatividade ainda menor que as aminas aromáticas, possibilitando um longo tempo de utilização durante o processo. Os processos de cura que fazem uso desses endurecedores são relativamente longos e possuem baixa exotermia e, por isso, eles normalmente são utilizados em conjunto com aceleradores.

Assim como se busca um grau de interligação de 100% dos radicais livres na cura de resinas poliéster e estervinílicas, é esperado que após a cura das resinas epoxy todos os grupos epoxy tenham reagido com os agentes de cura. Para isso, a estequiometria da mistura epoxy/endurecedor é fundamental.

É importante observar que, diferente da quantidade de catalisador, não é possível alterar a quantidade de endurecedor para acelerar ou retardar o processo de cura. Como esses agentes fazem parte da composição química final da resina termofixa, utilizar a quantidade incorreta de endurecedor pode prejudicas as propriedades mecânicas do laminado e até mesmo inviabilizar o processo de cura de forma permanente.

É importante destacar a íntima ligação do processo de cura com o calor, seja ele fornecido por uma fonte externa ou criado por meio da quebra das ligações saturadas e formação dos radicais livres. Nesse contexto é importante sempre pensar que quanto maior a área de troca de calor que a peça tem, mais difícil será a realização do processo de cura.

Ainda com isso em mente, é importante que a resina e o molde se encontrem em uma faixa de temperatura adequada antes do início da laminação, de acordo com as especificações dos fornecedores. Essa faixa de temperatura normalmente fica entre 15°C e 35°C e laminar abaixo desse patamar pode impedir o início da cura e acima pode deixar a resina muito reativa e com um tempo de gel muito curto.

Na próxima semana serão definidos mais alguns parâmetros importantes sobre o processo de cura de resinas termofixas, como a temperatura de transição vítrea e como alcançar níveis de interligação próximos de 100% por meio do processo de pós-cura. Além disso, mais informações sobre o tópico podem ser encontradas nos livros da Coleção Jorge Nasseh.