Fração em Peso e Volume de um Laminado

Uma das formas de se identificar as quantidades de fibra e resina dentro de um laminado e conseguir estimar os valores de resistência a tração, compressão, flexão e seus módulos de elasticidade é pelo cálculo de fração de volume e peso em um laminado. A estrutura básica de laminação é constituída por uma fibra de reforço, que pode ser vidro, aramida ou carbono e seus híbridos com uma matriz polimérica, seja ela poliéster, estervinílica ou epoxy.

Cada um destes materiais exibe uma densidade e um limite teórico para ser usado em conjunto, de modo que seja possível utilizar o menor valor possível de resina, mas ainda garantindo a impregnação de todas as fibras. Cada fibra apresenta uma característica diferente de “molhabilidade” em função do seu diâmetro e da compatibilidade com a resina. Quanto menor o diâmetro do filamento, maior a necessidade de usar resinas com melhor propriedade de adesão e maior pressão de vácuo sobre o laminado para que todas as fibras fiquem impregnadas e transmitam melhor os esforços entre si.

A fração em peso geralmente é aquela que o construtor usa para determinar a quantidade de fibra e resina em seu laminado, também conhecida como teor de fibra. Se o peso de cada produto dentro do laminado for conhecido, é possível então identificar a fração em volume da fibra e da resina por meio de formulações simples. A massa total, assim como o volume do laminado, pode ser descrita matematicamente como:

Equação 1

Equação 2

Onde V se refere ao volume, M a massa, o subscrito f a fibra, o m se refere a matriz de resina e o c ao composto inteiro. Dividindo os dois lados das equações por MC e VC, respectivamente, podemos obter as frações mássicas e volumétricas:

Equação 3

Equação 4

As frações mássicas e volumétricas são números que variam entre 0 e 1 que indicam quanto espaço ou massa elas representam no todo do laminado. Sabe-se que as frações mássicas são fáceis de se medir antes da fabricação do laminado com uma balança comum, por isso são muito úteis para calcular a densidade do composto. No entanto, a fração volumétrica é a variável utilizada para prever as propriedades do composto com base na micromecânica, por isso é importante ter uma forma de obter essa informação.

É possível identificar a fração em volume da fibra e da resina por meio da Equação 5, onde os subscritos f e m são intercambiáveis.

Equação 5

Na Figura 1, é possível encontrar a relação descrita pela fórmula anterior em um gráfico que diz respeito a três tipos de fibra muito comuns.

Figura 1 – Fração em volume em função da fração em peso

Como o principal fator na resistência e no módulo de elasticidade está associado à quantidade de fibra e resina dentro do laminado, no geral, quanto mais fibra, mais resistente é o laminado. Entretanto, uma quantidade reduzida demais de resina pode gerar um laminado seco e frágil, com baixa resistência a compressão, e uma quantidade grande demais irá produzir um laminado pesado e não econômico

Com isso, mesmo que o objetivo final fosse produzir um laminado com 100% de teor de fibra, esse número nunca poderia ser atingido, pois por melhor que as fibras fossem acomodadas, alinhadas e compactadas, ainda assim haveria espaços a serem preenchidos com resina. Isto só aconteceria se o laminado fosse unidirecional e todas as fibras fossem hexagonais e todas se tocassem por meio das arestas. Como as fibras têm uma forma quase circular, o agrupamento de três filamentos, por exemplo, iria criar um espaço vazio entre eles, proporcional ao diâmetro do filamento. Assim fibras com um menor diâmetro de filamento tendem a ter uma fração em volume maior e por esse motivo uma resistência maior.

Teste de Permeabilidade

A simulação numérica do processo de infusão é essencial para a fabricação de peças com alta resistência mecânica e eficiência econômica. A confiabilidade da simulação está diretamente ligada à qualidade dos dados de entrada no software, que incluem as características dos materiais e a geometria da peça a ser infundida.

A característica mais importante a ser determinada é a permeabilidade, que nada mais é que a resistência que o meio poroso apresenta à passagem da resina. Matematicamente ela pode ser determinada pela Lei de Darcy da seguinte forma:

 

A permeabilidade (K) depende, portanto, da viscosidade da resina (μ), da porosidade do meio a ser permeado (φ), do gradiente de pressão (ΔP) utilizado e do termo L²/t, ou seja, a posição da frente de resina ao quadrado dividida pelo tempo em que ela leva para chegar a tal posição.

Existem algumas maneiras de determinar a permeabilidade de forma experimental, mas a mais comum é utilizando a estratégia chamada edge injection, onde uma placa retangular é ensaiada e a entrada da resina ocorre em uma aresta enquanto a tomada de vácuo é aplicada na aresta oposta, como indicado na figura a seguir:

É importante deixar um espaço de 50 mm entre o fim do laminado e a saída de vácuo para se evitar a saturação da linha de vácuo. Para uma infusão perfeita, o gradiente de pressão deve estar acima de 0,9 atm e a viscosidade da resina deve variar entre os limites de 150 e 250 cps, independentemente do tipo de resina, seja ela estervinílica, poliéster ou epoxy.  A porosidade corresponde a fração de espaço vazio no meio poroso disponível para a resina ocupar. Cada tipo de reforço, diâmetro dos filamentos e o alinhamento das fibras, proporciona um valor diferente de porosidade.

Já a razão L²/t é o que se busca determinar experimentalmente. Para o ensaio de determinação da permeabilidade, é necessário utilizar o mesmo plano de laminação da peça que se pretende simular e construir. O teste deve ser feito em uma superfície plana e de preferência sobre um vidro onde se possa verificar a progressão da frente de resina nas duas faces do laminado. É importante que as condições de temperatura e umidade sejam adequadas para laminação. É sempre interessante realizar testes com temperatura controlada e testes nas condições reais onde a peça vai ser produzida.

A melhor opção para a dimensão das placas de teste é de 1200 mm x 600 mm, onde um freio de baixa permeabilidade é colocado perto da linha de captação de vácuo. Os tubos espirais que ajudam a distribuir a resina, as entradas de resina e saída de ar devem ser posicionadas da mesma forma que serão utilizados no projeto real e todos os materiais devem ser recobertos com uma camada de tecido desmoldante de nylon do tipo peel ply. A bolsa de vácuo deve então ser acomodada e fixada com a fita selante tipo tacky tape.

Vincos devem ser feitos na bolsa para permitir um melhor ajuste e evitar deformações. Não deve haver passagens livres entre a bolsa e as bordas do painel para não haver fuga da frente de resina. É sempre importante lembrar que a frente de resina permeia mais rápido onde existe menos resistência. Deve-se então conectar as mangueiras à entrada de resina e à saída de ar e garantir que não haja espaço para vazamentos.

É essencial que haja um cronômetro para acompanhamento do tempo que a resina leva para permear o laminado. É aconselhável também que o processo seja filmado ou fotografado periodicamente. Um medidor de pressão de vácuo instalado no sistema é aconselhável para acompanhar o nível de vácuo durante a infusão sendo, entretanto, necessário colocar algum obstáculo (uma camada de material) entre o medidor de pressão e o molde para que a aplicação do vácuo não colapse a bolsa ao seu redor e impeça o monitoramento da pressão. 

É necessário garantir que não haja uma queda significativa de pressão durante o teste e que a bolsa não apresente vazamentos. O objetivo do ensaio para determinar a permeabilidade do laminado é medir qual a distância que a resina é capaz de percorrer em intervalos regulares de tempo. Usualmente, a cada minuto deve-se marcar a posição da frente de fluxo.

Com as informações coletadas durante o teste, é possível calcular o valor de L² para cada uma das distâncias percorridas. O coeficiente L²/t pode ser então determinado pela equação:

Onde ti é o tempo na i-ésima distância, chamada de Li. Os símbolos e se referem às médias de tempo e distância, respectivamente, de todos os dados coletados. Após o cálculo do coeficiente L²/t, todas as informações necessárias para o cálculo da permeabilidade pela Lei de Darcy já foram determinadas.

Tipos de Groovings

Uma pergunta que recebemos quase que diariamente na Barracuda é “Qual o tipo de grooving (Corte) mais eficiente na construção náutica” e resposta é que não existe um corte que seja essencialmente melhor do que os outros. Existe uma grande variedade de groovings e suas eficiências dependem do processo de laminação e da geometria da peça a ser laminada.

O primeiro tipo de corte que podemos exemplificar é o GSP, que é a nomenclatura utilizada para placas planas sem nenhum tipo de ranhura. Esse tipo de placa é muito utilizada como núcleo de longarinas das embarcações, principalmente nas menores densidades como 40, 45 e 60 kg/m³.

A placa GSP tem uma variação chamada GSP Perfurada, indicada para laminação por vacuum bagging. As perfurações na placa permitem que todo o ar que possa ter ficado enclausurado nas primeiras camadas de tecido e também entre o tecido e o núcleo possa ser retirado.

A placa do tipo GSP Perfurada também pode ser utilizada na laminação com tecidos pré-impregnados (prepregs) mas é sempre necessário prestar bastante atenção na temperatura de distorção térmica do tipo de espuma que está sendo utilizado para que não aconteçam deformações durante a cura do prepreg, que precisa ser realizada em alta temperatura.

Outro tipo de corte muito comum é o DC, ou “Double Cut”, que é projetado para laminação manual e recebe ranhuras nas duas faces.

As ranhuras das placas DC são profundas e chegam a pouco mais do que a metade da espessura da placa e como o núcleo é fixado na camada externa do laminado com adesivo de colagem, essas ranhuras devem ser suficientes para que o adesivo preencha essa área e o excesso passe para a face de cima da placa através dos furos ocasionados pelo encontro dos frisos nas duas faces.

As placas ranhuradas para infusão recebem o nome de DCI, que significa “Double Cut infusion”. Nesse caso, as ranhuras são muito menos profundas que as das placas DC e devem ser suficientes para aumentar a permeabilidade do laminado e garantir que toda a peça possa ser impregnada com sucesso.

Esse tipo de placa também recebe perfurações para que a resina consiga fluir bem nas duas faces e as frentes de avanço de resina estejam sempre iguais nas faces de baixo e de cima da placa.

Esse tipo de corte deve ser muito bem feito, pois quando a qualidade do corte é ruim ou a espessura e profundidade dos frisos são grandes demais, esses frisos acumulam muita resina, o que gera acúmulo de calor e é muito provável que a peça fique com sua superfície marcada.

E, por último, outro tipo de corte também muito comum é o GS que é projetado para moldar em áreas curvas.

Esse tipo de placa é frisada somente em uma das faces e os frisos tem a profundidade quase igual a espessura da placa. A face de baixo da placa recebe uma tela de poliéster que garante que a placa não se separe quando flexionada.

Esse corte é muito utilizado em infusão a vácuo, principalmente em energia eólica e também para laminação manual. Quando utilizada no processo de infusão a vácuo, é muito importante que sejam realizados testes de permeabilidade na placa com cortes tipo GS, para garantir que todo o laminado seja impregnado.

Flow Model

Quando o objetivo é realizar uma grande infusão, um pequeno erro no dimensionamento ou posição das linhas de vácuo e resina pode causar a perda total da peça e um grande prejuízo. Por esse motivo a utilização de simulações computacionais se torna fundamental para garantir o sucesso do processo.

O objetivo da simulação é determinar com precisão o melhor layout de infusão e o tempo exato que a resina levará para impregnar todo o laminado. Como premissas, o programa leva em consideração a geometria da peça, a pressão de vácuo aplicada, a viscosidade da resina, a porosidade das matérias primas e a permeabilidade do laminado.

O sucesso da simulação depende da qualidade dos dados utilizados na simulação. Para começar, o modelo 3D da peça deve ser completamente fiel a peça final para que toda a geometria seja levada em consideração.

A diferença de pressão exercida pelo vácuo também deve ser fiel a utilizada na infusão final. Podemos simular uma super infusão levando em conta 1 atmosfera negativa de pressão sobre o laminado e na hora da infusão utilizarmos uma bomba de vácuo ineficaz e um molde cheio de vazamento que nunca serão capazes de entregar o resultado esperado.

Outro fator muito importante é a temperatura ambiente na hora da infusão, é sabido que as resinas costumam dobrar a viscosidade a cada 5°C a menos do que a temperatura informada no datasheet e reduzir na metade a viscosidade a cada 5°C a mais. Com isso é muito importante que a resina fique condicionada à temperatura mais próxima possível dos 25°C em fábricas situadas em lugares com temperaturas ambiente muito altas ou muito baixas.

Os dados de porosidade e permeabilidade precisam ser medidos através de testes práticos de infusão em corpos de prova. Esses testes precisam ser realizados em todos os tipos de laminados da peça e os dados gerados serão utilizados para alimentar a simulação de fluxo e com isso determinar a velocidade e comportamento da infusão em toda a peça.

Com todos esses dados corretamente inseridos, o programa irá utilizar uma versão da Lei de Darcy para determinar com exatidão o tempo final da infusão e o comportamento da frente de resina, possibilitando que o construtor não corra riscos durante a construção da peça final.

O Processo de Laminação Manual

Uma das escolhas mais importantes ao se construir um barco de materiais compostos é o processo a ser utilizado. Isso porque ele pode definir o teor de fibra, a qualidade e a espessura final do laminado além de características relacionadas à produção, como o tempo de laminação, capacidade de repetibilidade e automatização e mão-de-obra necessária.

O método de laminação manual utilizando moldes tipo fêmea é, sem dúvida, o método mais antigo utilizado na produção de barcos em fibra de vidro. É muito utilizado ainda hoje por construtores que acreditam que podem obter sucesso, inclusive financeiro, utilizando uma tecnologia de meio século atrás. 

Na maioria das construções por laminação manual os reforços usados são as formas básicas de vidro tipo E, como mantas e tecidos nas formas de combinados multiaxiais. É perfeitamente possível também utilizar reforços de fibras de alta performance com esse processo, mas outros métodos de produção mais sofisticados, que envolvem o uso de pressão e temperatura, e que requerem um maior controle da qualidade final do laminado são mais indicados para o uso destes materiais. 

A primeira etapa do processo de laminação manual é a aplicação de cera desmoldante para garantir a separação entre a peça laminada e o molde. É preciso realizar o pré-corte dos tecidos, mantas e materiais sandwich.  É importante ressaltar que é necessário do uso de sobreposições de no mínimo 50 mm na laminação de reforços de vidro, mas que não é incomum que essas sobreposições sejam maiores para acelerar o processo, o que faz com que a peça final tenha um peso maior que o esperado. 

Com o desmoldante aplicado e os reforços preparados, é necessário aplicar o gelcoat sobre o molde e então realizar a laminação do skin coat. Só então se inicia o processo de laminação dos reforços estruturais.  A quantidade e deposição dos reforços deve ser feita em estágios que dependem não só do gel time da resina, mas também do tipo de resina e das condições ambientais. 

A técnica básica de laminação se resume em utilizar resina suficiente para impregnar as mantas e tecidos previamente cortados, pressionando-os firmemente em sua posição. Depois da impregnação, o laminado pode ser compactado com o rolo de metal para remover qualquer bolha de ar que esteja presa. Os rolos devem ser usados molhados em resina, fazendo movimentos de ida e volta na extensão da área de trabalho à medida que a manta seja impregnada.

Logo que a resina inicie o estado de gel, o trabalho deve ser interrompido ou o laminado poderá se mexer, possibilitando a criação de espaços vazios. É necessário então limpar a ferramentas de laminação antes que a resina gelifique. 

Não é coerente falar que o processo de laminação manual não é capaz de produzir barcos viáveis sendo que ele é utilizado por diversos estaleiros há muitas décadas. No entanto, é importante ressaltar seus pontos fracos. As propriedades finais das peças dependem muito da habilidade do laminador, o que significa também que a repetibilidade do processo é bastante limitada. A quantidade de vazios dentro do laminado é grande, o que prejudica a qualidade das peças. Além disso, o teor de fibras máximo que pode ser alcançado é de 40%, produzindo um laminado com excesso de resina e excesso de peso, por consequência. 

Construção de Modelos

Como me disse um grande construtor, a fabricação de moldes se enquadra no conhecido enunciado de que para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, rápida e errada! Ao contrário do que muita gente pensa, a construção de moldes não é uma arte mas sim uma ciência. Existe um script que funciona e se você segue esta receita a chance de sucesso é grande. Qualquer tentativa de cortar caminho é certeza de que em alguma hora você vai se deparar com um problema, que na maioria das vezes tem uma solução cara.

Ter um projeto adequado com as linhas geradas por computador e cortado com precisão de 0.001% é como os construtores profissionais fazem hoje em dia. Já foi o tempo que se construía um modelo de um barco de 30 pés a partir de um casco antigo de 20. Depois pegava o casco de 30 pés, cortava no meio e crescia mais 10 pés e aí tinha um barco de 40 pés. Já vi uma vez um barco de 65 pés ser construído a partir de um casco velho de 34 pés. O resultado desta empreitada eu não preciso nem dizer.  O problema é que muita gente da velha guarda ainda não consegue visualizar as vantagens de se ter um sistema onde o projetista pensa e o construtor executa. Muitos construtores do passado têm enorme dificuldade de entender um plano de linhas ou um desenho 3D e preferem virar um casco antigo de cabeça para baixo e começar uma incrível operação de estica-e-puxa.

Um bom projeto é fornecido com as seções ajustadas para o corte em CNC em madeira prensada do tipo MDF. Em seguida a montagem da base e das cavernas são feitas com precisão milimétrica. Depois o casco é forrado com ripas longitudinais e madeira de modo que se tenha uma superfície exata e fiel do desenho do projetista. Sobre esta superfície é aplicada algumas camadas de fibra de vidro e depois massa. Muita massa e muita lixa. Mais lixa do que massa. Quando a superfície estiver impecável é aplicada a última camada de tinta que vai deixar o modelo pronto para a fabricação do molde. Como este mesmo construtor diz, só improvisa quem já fez certo um milhão de vezes.

Aspecto Cosmético dos Laminados

O sucesso comercial de muitas peças produzidas com materiais compostos laminados está atrelado ao seu apelo estético, tanto em barcos quanto em aviões e automóveis. No processo de laminação manual, a primeira camada sobre o molde é o gelcoat e em seguida é aplicado o skin coat, que pode variar caso a caso entre 600 g/m² e 900 g/ m² de manta de fibra de vidro e resina poliéster.  

Usar um laminado mais espesso no skin coat é aceitar ter uma penalização de peso mas também reduz a possibilidade de ter boa parte do laminado impresso pelo lado externo do laminado. O skin coat deve ser aplicado com uma resina de comprovado alto valor de HDT (temperatura de distorção térmica) para suportar sem prejuízos a liberação do calor causada pela cura exotérmica da resina de laminação que pode causar temperaturas de até 80°C.

O laminado do skin coat deve ser composto por mantas de fibra de vidro, mas neste ponto existe um dilema que deve ser enfrentado cedo ou tarde por qualquer construtor. A função básica das camadas cosméticas do laminado é proporcionar um acabamento exemplar e fornecer uma barreira para evitar a osmose quando é necessário o contato com água e umidade. No entanto, quanto de fibra e resina é o suficiente?

Poucas camadas podem comprometer o acabamento estético, mas muitas camadas podem comprometer o peso final da estrutura. Um skin coat à prova de problemas cosméticos pode ser executado com duas camadas de manta 300 g/m² e mais duas camadas de manta 450 g/m². A próxima camada a ser laminada pode então ser um tecido biaxial combinado com manta que deve ter entre 225 e 300 g/m². Nesta configuração, o construtor vai ter um laminado de baixa resistência com 5 kg/m² de peso sem contar o gelcoat, o que representa o acréscimo de quase 800 kg no casco de um barco de 60 pés de comprimento.

O uso de um processo estável de laminação, como a infusão, possibilita ao construtor reduzir ao máximo a gramatura da camada de acabamento externo. Em alguns casos, é possível usar somente uma manta de 300 g/m² que vai ser depositada junto com o restante do material de infusão. Um outro ponto a ser considerado durante a elaboração do skin coat é que laminar manualmente uma grande quantidade de fibra sobre o gelcoat significa um consumo de energia e tempo gigantesco.

Laminando com Resinas Éstervinílicas

As resinas éstervinílicas possuem características mecânicas e custos intermediários entre as resinas poliéster e epoxy. A química dessas resinas foi desenvolvida no final da década de 1950 e início de 1960 por vários pesquisadores e cada uma delas teve uma formulação diferente. As primeiras eram tão reativas que não tinham tempo de vida suficiente para serem utilizadas. É importante salientar que a resina éstervinílica tem sua origem numa resina epoxy, que utiliza um radical bisfenol do tipo A e epicloridrina. As resinas éstervinílicas utilizam um substrato diluído em derivados acrílicos e monômero de estireno.

Ao contrário das resinas poliéster que são formadas a partir de repetidas moléculas de ésteres, as éstervinílicas apresentam essa estrutura apenas na ponta de suas cadeias, o que fornece propriedades superiores. Os grupos ésteres são ligações fracas e podem ser atacadas pela água, o que resulta em baixa resistência química e na hidrólise. No cotidiano da náutica, isso pode ser observado por meio dos problemas de blistering em barcos, que são a formação de bolhas devido à degradação da matriz de resina pela ação da água.

Outras vantagens em relação a presença de grupos ésteres apenas na ponta das cadeias é a garantia de maior capacidade de deformação, maior resistência ao impacto e maior vida útil sob fadiga. As resinas éstervinílicas possuem excelente desempenho mecânico, dureza e boa resistência à hidrólise e a produtos químicos básicos já que têm como base resinas epoxy. No entanto, seu processamento é um pouco mais difícil em comparação à resina poliéster e seu custo um pouco mais alto.

O mecanismo de cura dessas resinas é muito similar ao das poliéster insaturado, pois utilizam o mesmo solvente de estireno. O processo de gelificação e a cura da solução das resinas de poliéster ou estervinílicas acontece através de uma reação onde há liberação de radicais livres. Para tanto, usa-se um catalisador do tipo peróxido, que inicia uma reação de ligações cruzadas responsável pela formação da matriz tridimensional.

Quando a reação cruzada começa, o movimento da solução se torna restrito depois de determinado tempo, saindo do estado líquido para o estado de gel. Esse tempo é chamado de gel time, que é efetivamente o tempo que se tem para trabalhar a resina. Nessa reação cruzada (cross-link), as cadeias de polímeros começam a se ligar ao monômero de estireno e este a outros pontos com duplas ligações, e assim sucessivamente, formando um sólido, uma massa compacta que não irá se fundir mesmo com a exposição à temperatura, por isto ele é chamado de termofixo.

Laminação por Vacuum Bag

Apesar de o método de laminação manual ser capaz de entregar laminados com boa resistência, durabilidade e aparência cosmética, o uso de vaccum bag é capaz de fabricar uma estrutura mais leve e mais forte. A ideia é usar a pressão atmosférica para compactar o laminado durante o processo de cura.

É possível realizar a laminação de peças sólidas ou utilizar esse método para colagem de materiais sandwich. O processo consiste em posicionar os reforços e impregnar manualmente o laminado com resina antes de revesti-lo em uma bolsa plástica, que é conectada a uma bomba de vácuo usada para remover o ar existente dentro da cavidade do molde. Para esse processo pressões entre 0,4 e 0,6 atm são suficientes.

Esquema de laminação a vácuo

Entre o laminado e a bolsa de vácuo há alguns outros materiais descartáveis essenciais para o sucesso do processo. A começar pelo tecido de poliamida, chamado de peel ply, posicionado em contato direto com o laminado e que possui a função de desmoldante e facilita a retirada dos demais materiais descartáveis após o processo de cura. Acima do peel ply deve ser colocado um filme perfurado, usado para deixar passar ou bloquear a passagem de resina, já que normalmente se utiliza umva quantidade de 3% a 5% maior de resina do que o projetado para facilitar a impregnação inicial e que deve ser retirada durante a aplicação de vácuo.

Em sequência, é posicionado um material absorvente, chamado breather, que tem a finalidade de absorver a resina que que o filme perfurado deixou passar e homogeneizar a distribuição de vácuo. Finalmente a bolsa de vácuo fecha o envelope e deve ser fixa no molde com a tacky tape, uma fita emborrachada dupla face que tem cerca de 12 mm de largura.

Todos os materiais descartáveis devem ter resistência a temperatura e aos solventes emitidos pelas resinas durante o processo de cura exotérmica. Para resinas que curam a temperatura ambiente, os materiais devem ser especificados para uma operação mínima de 80°C.

Como a impregnação dos reforços deve ser feita de forma manual, dependendo das dimensões do laminado esse processo toma bastante tempo. Por esse motivo é preciso utilizar uma resina com gel time alto, normalmente epoxy, o que aumenta o custo do processo.

Apesar do custo dos materiais descartáveis, da bomba de vácuo e da resina, o processo é capaz de entregar um teor de fibra de cerca de 50%, maior que os 40% da laminação manual e da faixa de 20 a 30% obtida pelo spray-up. Por esse motivo a estrutura fica mais leve e tem aumentos consideráveis nas propriedades mecânicas. Além, é claro, de que o uso de vácuo para compactação das fibras também diminui a quantidade de vazios e melhora a qualidade do laminado.

O Uso de Tecidos Unidirecionais

É possível também variar a quantidade de fios em cada direção e fabricar tecidos que tenham propriedades mecânicas direcionais. Normalmente, o máximo que se faz comercialmente são tecidos com diferenças na quantidade de fios de 30% a 70% entre as direções. Quando pelo menos 70% dos tecidos são colocados, ou concentrados, em uma só direção ele é chamado de tecido unidirecional. 

Estes tecidos são produzidos em larguras que variam do tamanho do rolo normal de 50 polegadas ou até fitas (tapes) com 2” (50mm), 4” (100mm), 6” (150mm) e 8” polegadas (200mm), incluindo também larguras intermediárias.  Para tecidos unidirecionais de carbono as larguras comerciais são de 300mm (12”) e 600mm (24”) pois são mais fáceis de serem utilizadas com impregnadores ou com tecidos do tipo pré-impregnado.

Os tecidos colados transversalmente são melhores porque, além de eliminarem as poucas tramas, são muito fáceis de serem impregnados. Esta forma de reforço aumenta bastante as propriedades direcionais, embora na direção transversal ou em qualquer outra, a sua resistência seja muito baixa.  Entretanto, o que sempre acontece, é que esse tipo de tecido é colocado nas regiões onde o construtor já determinou a direção principal do esforço.

Existe um grande número de opções disponíveis para se comprar tecidos unidirecionais não tramados, colados ou fabricados de uma dezena de formas diferentes.  Todos eles têm prós e contras, o que só é possível ser descoberto com testes práticos. Note também, que a resistência e o preço podem variar muito entre todas estas configurações.       

É também possível a construção de laminados a partir de tecidos unidirecionais, variando sua orientação através de suas camadas. Uma grande vantagem desse método é a redução da espessura e o excelente teor de vidro, que normalmente excede aos tecidos bidirecionais. Dessa forma, você pode construir um tecido apontado para quatro direções diferentes, [0/ 90/ 45/ -45] com predominância em uma ou duas delas, e otimizar resistência e peso. Observe, entretanto, que as dificuldades de moldagem são enormes com esse tipo de material e vão exigir limitações de ordem construtiva.

Os tecidos unidirecionais podem ser fabricados somente com um tipo de fibra ou com a combinação de duas delas. Os padrões mais usuais de tecidos unidirecionais híbridos são de carbono com kevlar e vidro com kevlar.  Os tecidos unidirecionais têm gramaturas que variam entre 80 e 1200 gr/m2.

O Uso de Tecidos Bidirecionais

Os tecidos bidirecionais mais leves, na faixa de 60 a 400 gr/m2, estão disponíveis numa grande variedade de tramas que terão diferentes características. O tipo de trama afeta na facilidade com que o tecido é impregnado e com a qual ele faz curvas, além disso, quanto mais preciso o trabalho de tecelagem maior será a resistência do laminado.  Mesmo com uma construção precisa, para a mesma gramatura os tecidos unidirecionais e multiaxiais tendem a ser mais resistentes que tecidos com tramas bidirecionais.

A trama mais comum nos tecidos disponíveis no mercado é a plana, onde cada cabo passa sobre o outro alternadamente. Nesta trama, os cabos podem ser planos ou retorcidos nas duas direções ou mesmo plano em uma delas e retorcido na outra. 

Veja ainda se o tecido que você está procurando tem a mesma quantidade de fios nas duas direções, pois isto irá determinar se o tecido é balanceado ou não. Neste tipo de tecido, a abertura entre os cabos é essencial para o resultado final da laminação. 

Tecidos muito frouxos tendem a abrir buracos durante a laminação, oferecendo ao laminado áreas ricas em resina. A maioria dos fabricantes chama este fenômeno de porosidade. Outro tipo de trama comum de ser encontrada é a basket, onde, ao invés de um cabo, são utilizados dois, um ao lado do outro, para tecer uma trama plana.

Os dois outros tipos, com certeza, são os mais sofisticados e apresentam apenas poucas variações entre eles.  Na trama tipo Twill ou Satin, chamada em português de sarja, cada fio cruza duas, três, quatro ou mais camadas perpendiculares a esta. Se na sua configuração de construção ela cruza apenas duas vezes, a trama é chamada de Twill; se ela cruza três ou quatro é denominada Crowfoot.  Se durante a tecelagem os fios passam uns sobre os outros mais que cinco vezes, ela chama-se Satin, que normalmente podem ser cinco ou oito.  A última trama, pouco utilizada em laminados de barco, é a do tipo Leno, uma trama bem aberta onde os fios retorcidos conseguem manter a estabilidade do material.

O Uso de Tecidos Híbridos

Na tentativa de melhorar as propriedades do laminado, muitos construtores têm utilizado em embarcações tecidos híbridos, fabricados a partir de dois ou mais tipos de fibras, oferecendo a possibilidade de agrupar as vantagens dos materiais e minimizar as desvantagens. 

O termo híbrido significa que o material é feito a partir de dois ou talvez mais tipos diferentes de fibras. As vantagens de incorporar duas fibras em um tecido é que as propriedades finais do reforço aumentam devido ao ajuste das propriedades individuais de cada fibra. Por exemplo: se é necessário obter um laminado rígido com uma boa resistência ao impacto e um baixo peso, o construtor pode escolher um tecido híbrido de carbono com Kevlar®. O carbono irá prover a rigidez e as fibras aramidas contribuirão com a resistência ao impacto.

No caso de se estar procurando o ajuste de propriedades mecânicas e custo, o mais comum é agrupar as propriedades do Kevlar® com as da fibra de vidro.  De qualquer forma, a combinação de tecidos de fibra de vidro, carbono e Kevlar® pode ser usada para otimizar propriedades mecânicas e custo. Geralmente estes tecidos híbridos são feitos por encomenda e podem ter também uma infinidade de combinações, dependendo basicamente de quanto dinheiro se quer gastar.  Os tecidos híbridos são encontrados nas tramas bidirecional, unidirecional, biaxial, triaxial e quadriaxial em gramaturas que variam entre 80 e 1800 g/m².